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28/07/2020 - 12:01

Empresa de médicos deixa a UTI do Hospital São Luiz

A empresa DELPHOS MEDICINA, que desde abril de 2019 é a responsável técnica pela UTI de Adultos do Hospital São Luiz, não mais atuará no hospital a partir do mês que vem.

A empresa foi comunicada pela Pró Saúde, entidade proprietária do hospital que uma nova equipe foi contratada para sucedê-la na atividade.

Durante o período em que esteve contratada pela Pró Saúde, a DELPHOS fez várias mudanças na organização do atendimento aos pacientes graves da região de Cáceres.

O líder executivo da empresa responde a algumas perguntas sobre este período de atividade em Cáceres.

P: A empresa é originalmente de São Paulo.

Por que vieram trabalhar em Cáceres?

Delphos: Por termos experiência na gestão de cuidados para pacientes graves, como Pronto Socorro e UTIs e atuarmos em vários locais do país há mais de 10 anos, fomos convidados pela Pró Saúde a participar de uma licitação para assumir a gestão da UTI de Cáceres. Competimos com outras empresas nessa licitação. Apresentamos um projeto completo para cuidar dos pacientes, que já utilizamos em vários outros locais com muito sucesso.

P: De onde são os médicos que trabalham com a empresa?

Delphos: Todos os médicos que trabalhavam antes na UTI foram convidados a continuar e aceitaram. No início, como é parte da nossa organização, trouxemos profissionais experientes em Medicina Intensiva, que são nossos consultores para implantação do nosso sistema de trabalho. Esses médicos são professores e atuam em hospitais como o Servidor Público do Estado de São Paulo, UNICAMP, Rede AMIL e outros. A seguir, a responsabilidade técnica passou para o Dr. Alexandre, que realizou a Residência Médica em Medicina Intensiva na UNICAMP, é especialista titulado pela AMIB (Associação de Medicina Intensiva Brasileira) e tem Mestrado e Pós-Doutorado pela UFMG, que veio residir em Cáceres. Toda a equipe de plantonistas foi mantida com médicos de Cáceres. Alguns desses médicos não se adaptaram a algumas exigências do novo método de trabalho e deixaram o serviço. Foram substituídos por outros médicos também de Cáceres.

P: Por que esses médicos não se adaptaram? Quais foram as mudanças que a empresa teve que fazer?

Delphos: A principal mudança foi a de cultura de trabalho. Antes, as atividades eram realizadas em plantões e não havia médicos que acompanhassem os pacientes todos os dias. Sabemos que esse acompanhamento é muito importante para que o tratamento seja mais eficiente e os pacientes possam ficar menos tempo na UTI. Também tivemos que organizar protocolos para que as prescrições de medicamentos fossem padronizadas e não ficassem sendo alteradas de acordo com o entendimento de cada médico, e otimizar os exames de rotina, pois era realizado um grande número de exames desnecessários, especialmente de Cardiologia, o que não servia para melhorar os pacientes e prolongava a permanência deles na UTI, aumentando o risco de infecções hospitalares e o risco de morte. Várias outras práticas tiveram que ser introduzidas porque não estavam sendo utilizadas anteriormente e os profissionais não estavam habituados a esse modelo de gestão.

P: Que práticas são essas que não eram feitas anteriormente?

Delphos: A principal é a visita multidisciplinar. É uma reunião diária à beira do leito do paciente, quando os médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, nutricionistas e assistentes sociais compartilham as informações sobre o andamento do tratamento de cada paciente e estabelecem procedimentos e metas diárias de tratamento para serem cumpridas. Essa atividade é mandatória atualmente e é fantástica porque todos participam com responsabilidade e poder de decisão, e todos os detalhes podem ser acompanhados. Isso faz com que diminuam problemas, com que os pacientes sejam retirados de ventilação mecânica mais rapidamente, que tenha menos infecções por conta de sondas e cateteres. Uma atividade indispensável.

P: Então a empresa teve que trocar muitos médicos?

Delphos: Não. Na verdade, alguns médicos preferiram não continuar mas vários permanecem até hoje. Outros médicos foram incorporados a empresa e estamos treinando uma nova geração muito interessada e comprometida em aprender mais e mais sobre os cuidados aos pacientes graves. Eles atuam mesclados com os mais experientes e são originários de Cáceres ou formados aqui. Interessante, que um dos pontos do nosso sistema de gestão é o treinamento dos profissionais. Além das reuniões diárias a beira do leito, quando o conhecimento é compartilhado entre todos os profissionais, o projeto da empresa inclui cursos presenciais. Foram realizados dois cursos no Hospital São Luiz, com instrutores da AMIB e não foram somente para nossos médicos. Enfermeiros, fisioterapeutas, assistentes sociais também participaram. Convidamos também profissionais que atuam no Hospital Regional e na Central de Regulação de Leitos. Vários deles participaram. P: Estas mudanças todas provocaram resultados práticos para os pacientes?

Delphos: Certamente, pois não são processos de organização inventados por nossa empresa, mas sim amplamente aprovados em outras UTIs. Além disso, nossas lideranças são altamente experientes e instrutores de cursos e congressos, tanto de Medicina Intensiva quanto de Gestão de Saúde, além de serem referências para a imprensa nesses assuntos. Nosso Líder Técnico, Dr. Rezende, participa com frequência de jornais da TV, especialmente agora nesta pandemia. Também publicamos artigos de opinião sobre esses assuntos em vários veículos.

P: Exatamente o que melhorou?
Delphos: Pra se dizer que melhorou, a gente precisa ter números, ter medidas. Não havia registros da maioria dos indicadores ou critérios de avaliação da UTI antes de chegarmos. Apenas alguns poucos dados básicos. Mas, esses indicadores básicos, se não servem para melhorar os resultados, representam uma avaliação interessante. Em todos os hospitais onde trabalhamos, introduzimos um sistema especializado na coleta e análise desses dados: o EPIMED MONITOR. É feito por uma empresa brasileira e hoje está em centenas de hospitais públicos e privados em todo o país. O sistema também está em uso na Colômbia, Bélgica e na França. Empresa nacional, criada e desenvolvida no Rio de Janeiro! Mas, voltando à pergunta, antes da nossa gestão a taxa de mortalidade na UTI era de 45%. E caiu para 30%. Mas o mais importante, é que a probabilidade de óbito, que é avaliada pelo sistema quando o paciente é internado, aumentou de 25% para 33% porque passamos a receber mais pacientes e muito mais graves do que antes. Mesmo assim, conseguimos manter a taxa de mortalidade abaixo da probabilidade de óbito. Pra se ter uma ideia, usando este dado, vemos que antes das mudanças realizadas a ocorrência de óbitos era cerca de 80% acima do que era esperado. Depois de um ano, a ocorrência de óbitos é 8% menor que o esperado. Precisamos destacar, que além da reorganização da gestão da UTI e dos treinamentos realizados, a atuação incansável do Dr. Alexandre, da equipe de médicos, enfermeiros e demais profissionais foi fundamental para isso. Outra importante melhora foi no tempo de permanência dos pacientes na UTI. Lembra que quanto mais tempo maior o risco de infecções e outras complicações? Pois é! Cada paciente ficava 10,5 dias internado na UTI em média. Em nosso período de atuação, caiu para 6,5 dias, uma redução de 40%.

P: Mas se os resultados foram bons, por que a empresa será substituída?

Delphos: Essa é uma decisão unilateral da direção do Hospital e da Pró-Saúde. Como se trata de um contrato entre duas empresas privadas, é direito de qualquer das partes rescindi-lo quando entender necessário. A empresa proprietária do hospital alega que vem tendo dificuldades no recebimento dos repasses orçamentários provenientes do atendimento ao SUS. Esse é um aspecto importante pois estamos com atrasos de cerca de 3 meses no recebimento pelos serviços prestados, o que tem dificultado a manutenção dos profissionais em atividade. Mas, mesmo com a pandemia do coronavírus, nossos médicos tem mantido a dedicação aos serviços. Alega-se também que há problemas com o encaminhamento de pacientes pois, apesar de inúmeras reuniões, os critérios de internação dos pacientes determinados pelo Conselho Federal de Medicina, ainda não foram totalmente compreendidos pela regulação de leitos. Uma UTI não é concebida para internar pacientes terminais, sem chance de recuperação ou pacientes sem gravidade suficiente para precisar de um leito intensivo. Em função desses dois aspectos, nosso coordenador teve muitos desgastes profissionais e até pessoais com parte da classe médica de Cáceres e optou por seguir sua carreira em outro local. A contratação da nossa empresa tem sido questionada desde o primeiro momento por autoridades locais, embora isto seja assunto de foro privado entre o Hospital e as empresas que contrata para prestar serviços. Atuamos sempre dentro de todas as normas e leis, com toda a situação administrativa perfeitamente em ordem. Recentemente, também fomos auditados pela Prefeitura que detectou que tudo está dentro das normas. Somos uma empresa com vários “cases” de sucesso em hospitais públicos e privados em vários locais do país e atuamos com profissionalismo. Assim, entendemos que o contrato só é bom quando as partes todas se beneficiam. Acreditamos que a Pró Saúde, com todo seu histórico de administração de hospitais está fazendo a escolha que entende ser melhor para que possa se inserir mais efetivamente na comunidade de saúde de Cáceres e da região, e que contratará outra empresa à altura das necessidades de manter elevado nível de qualidade.

P: Há algo mais a destacar nesse tempo de atividades da empresa em Cáceres, algum comentário a mais?

Delphos: Após o difícil período de implantação de uma gestão assistencial moderna e efetiva na UTI do São Luiz, acreditamos que a maior contribuição da nossa empresa foi formar um legado de organização de processos, valorização dos médicos e demais profissionais de saúde que lá trabalham e, principalmente, a inserção e treinamento de novos profissionais de Cáceres, que estão mais aptos a fazer um bom trabalho pela população daqui pra frente. Acreditamos que sempre é possível melhorar. Muitos desses profissionais, especialmente os médicos que incorporamos e que estão sendo convidados para continuar a trabalhar com a nova empresa que assumirá em breve, já portam uma bagagem importante de novos conhecimentos. Desse modo, devese esperar que os resultados sejam melhorados agora que as bases já foram lançadas e as resistências, embora ainda presentes, foram diminuídas. Consideramos isso um legado da Delphos para o Hospital, para a comunidade de saúde e para a população de Cáceres. Torcemos para que seja bem aproveitado.
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