Imprimir

Imprimir Artigo

02/03/2019 - 19:03

Jovens de esquerda denunciam invasão e agressão de PMs em festa

Uma festa de Carnaval se tornou caso de polícia, na madrugada deste sábado (2), em Cuiabá. Os organizadores da comemoração relatam que policiais militares cometeram excesso na abordagem e agrediram jovens que estavam no local. A PM afirma que agiu conforme a Lei, após receber denúncia contra o evento.

O evento, intitulado Carnaval da Ursal, organizado por jovens esquerdistas, acontecia em uma residência no bairro Boa Esperança quando policiais militares chegaram, por volta da 1h.

Segundo uma das organizadoras da festa, fiscais da Prefeitura de Cuiabá e a PM foram ao local para verificar o nível do som do evento, em razão de uma denúncia de que o festejo supostamente estaria infringindo a Lei do Silêncio.

“Os fiscais utilizaram equipamentos para avaliar os decibéis e disseram que estava tudo conforme a Lei. Não estávamos infringindo nada, até porque nos preocupamos em usar apenas uma caixa de som”, relata a universitária A.S.S.

“Todos os vizinhos tinham assinado um termo de autorização para a festa. Inclusive, levamos o ofício para a Polícia Militar da região”, acrescenta a jovem.

Pouco depois, segundo a jovem, os policias militares voltaram. "Fomos surpreendidos com a chegada de nove viaturas, com policiais armados, dizendo que estávamos sendo autuados por perturbação da ordem”, detalha A.S.S.

"Tentamos dialogar com os policiais para entender a denúncia, porque a Polícia havia saído do local há pouco. O tenente falou que um vizinho disse que representaria contra a gente por perturbação da ordem. Tentamos argumentar que o som estava dentro dos parâmetros legais, mas mesmo assim disseram que tinham recebido a denúncia e iriam tomar as providências", comenta.

“Eu estava dentro da minha casa, em um som dentro dos limites permitidos, e não entendia porque estavam ali", acrescenta.

Segundo a universitária, os organizadores tentaram explicar aos policiais que eles não tinham autorização para entrar na residência, por ser uma propriedade privada. “Dissemos que se eles quisessem, poderíamos levar a caixa de som para eles, mas nada adiantou”.

Dois dos organizadores da festa tentaram impedir a entrada dos policias, pois ressaltaram que eles não tinham autorização. “Aí os PMs começaram a agredir os garotos. Jogaram no chão e dispararam spray de pimenta. Eram vários policiais armados para conter apenas duas pessoas. Eles foram jogados no chão e algemados”, diz A.S.S.

Depois que os amigos foram levados para viaturas, a jovem conta que um subtenente que participou do caso a chamou, logo após ela se identificar como uma das organizadoras da festa.

“Eles me xingaram, mandaram calar a boca e disseram que iriam entrar na casa, porque a gente também poderia até ser enquadrado por corrupção de menor ou tráfico de drogas. Eu disse que essas acusações eram totalmente infundadas. Pedi respeito. Mas me mandaram calar a boca novamente”, detalha.

Diante da insistência dos militares, a jovem conta que teve de permitir a entrada dos policiais na casa. “Eles tinham quebrado o portão, quando tentaram forçar para entrar. Tive que pedir para quatro pessoas ajudarem a suspender o portão para que os policiais pudessem entrar”, relata.

A jovem conta que os policiais alegaram que entrariam na casa apenas para pegar o aparelho de som. “Eles queriam entrar em todos os quartos. Alguns cômodos estavam trancados, porque é uma coisa que fazemos em qualquer festa, para guardar os itens pessoais. Mas queriam entrar a todo custo. Só que a chave estava com um dos rapazes que tinha sido preso e, por isso, não conseguiram. Eles até falaram em arrombar as portas”, afirma A.S.S.

Por fim, os dois jovens algemados, a universitária e um rapaz que também se apresentou como responsável pelo evento foram detidos e levados para a Central de Flagrantes.

“Pegaram nossos dados, encaminharam a gente para a cela. Ficamos todos no mesmo lugar, por algumas horas, sem banheiro, nem água”, diz a universitária.

Eles assinaram um Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) e foram liberados por volta das 5h deste domingo.

O boletim de ocorrência

De acordo com o boletim de ocorrência, um homem que mora próximo ao local do evento disse que o barulho da festa estava ensurdecedor. Mesmo estando dentro do limite permitido pela Lei, o homem disse que o som estava impedindo seu descanso. 

Diante da denúncia, a PM foi à residência em que acontecia a comemoração. Segundo o boletim de ocorrência, o jovem F.L.P., 26 anos, disse ser o proprietário da casa. No local, os policiais disseram ter visto uma caixa de som que estava encaixada em um pedestal e escondida em um dos cômodos.

"Na abordagem no local, foi informado a F. que, na condição de responsável pela festa, seria conduzido à delegacia e que o aparelho de som que serviu de instrumento para a emissão de ruído que perturbou a vítima seria apreendido e vinculado na ocorrencia", narra trecho do boletim de ocorrência, feito por policiais militares que atenderam a ocorrência.

Ao saber que o som seria levado, segundo o B.O., o jovem F.L.P. e um amigo, A.C.R., ficaram em frente ao portão e impediram a entrada dos policiais.

"Foi dada ordem para que eles não obstruíssem o serviço policial, sendo desobedecido por ambos. Foram utilizadas técnicas de controle de contato para a desobstrução da entrada e ambos ofereceram resistência passiva, sendo necessário fazer a remoção de ambos, para isso foi necessário o uso de forças, uma vez que um deles se prendeu no portão e rapidamente se formou uma multidão de pessoas que realizaram empurrões nos policiais que estavam na abordagem", diz outro trecho do boletim de ocorrência.

Diante do impasse, segundo a PM, os jovens foram algemados. "Em ambos os algemamentos foram necessários quatro policiais, em razão do tumulto que se formou no local. Foi utilizado spray de pimenta para dispersar a multidão que se formou. Os conduzidos que foram algemados dificultaram o máximo que foi possível, porque ambos chegaram ao ponto de deitar e rolar no chão", afirma o B.O.

No boletim, os PMs confirmam ter usado força contra os jovens, pois, segundo os militares, os rapazes utilizaram de força para tentar impedir que fossem algemados.

Ainda conforme o registro dos militares, após os dois jovens serem levados para as viaturas, A.S.S. se apresentou como organizadora do evento.

“Após vários minutos de verbalização, foi possível entrar no local para retirar os equipamentos de som que estava sendo usado. Porém, ao chegar ao local, foi possível notar que foi trancado em um cômodo da casa. Diante da situação de pequena gravidade, não foi necessário fazer o arrombamento das dependências para recolher o som, porque não havia mais a emissão de ruídos que causassem perturbação do sossego do solicitante”, diz o B.O.

Por ter se identificado como responsável pela festa, conforme os militares, a jovem também foi conduzida para a Central de Flagrantes da Capital.

Denúncia contra militares

A.S.S. afirma que as informações que constam no boletim de ocorrência não correspondem aos fatos. “O tenente relatou os fatos sem nos ouvir, colocou apenas a versão dele, totalmente fora do contexto que ocorreu”, diz.

Nas redes sociais, os jovens compartilharam as imagens dos rapazes agredidos pelos policiais. Neste sábado, eles planejam registrar um boletim de ocorrência sobre o caso. Uma das medidas que podem ser tomadas pelo jovem é denunciar a situação à Corregedoria da Polícia Militar.

“Se houve ou não excesso na atuação policial é uma questão que pode ser apurada e esclarecida pela Corregedoria da Polícia Militar. Portanto, a Polícia Militar, por meio da Corregedoria, se coloca à disposição”, informou a PM, por meio de comunicado.
Imprimir