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11/02/2018 - 09:28 | Atualizado em 11/02/2018 - 09:31

Grafiteiro cacerense faz sucesso com 'poesia visual' em Cuiabá

O grafite sempre foi uma manifestação duramente criticada por muitos, pois em alguns aspectos sua expressão pode ser interpretada como rabisco que causa poluição visual, ou até ato de vandalismo.
 
Nos últimos tempos, porém, o grafite passou a ser uma arte de rua reconhecida pela sofisticada qualidade artística.
 
Hoje as pessoas podem também admirar a beleza estética dos traços em meio ao caos da vida nos grandes centros urbanos. 
 
O artista plástico Rafael Jonnier, que possui diversas obras pelas ruas de Cuiabá, acredita que o grafite traz benefícios para a cidade.
 
“Eu sei que estando ali, eu vou ajudar aquele espaço para quem passa. Isso é para transformar em uma poesia visual, não uma poluição visual”, afirmou.
 
Para o grafiteiro de 26 anos, a arte de rua tem conquistado um grande espaço na sociedade.
 
“Hoje você pode ver que tem casa, condomínios fechados, apartamentos de luxo com grafite. Está mudando esse conceito de marginalizado”, disse Rafael.
 
Ele acredita que o preconceito com o grafite está diminuindo com a evolução das tecnologias e dos próprios artistas.
 
“Hoje esse preconceito está diminuindo. Acho que as redes sociais estão ajudando muito. E de um tempo para cá começaram a surgir outros tipos de grafiteiros que começaram a levar para a galeria, a comercializar essa arte”, relatou.
 
Apesar disso, existe a pichação que contribuiu para o desenvolvimento do grafite, avalia.
 
“O piche é um código entre pessoas que estão na rua. Mas o bom é que o piche respeita o grafite e o grafite respeita o piche. Se não fosse o piche, não sei como o grafite iria existir. Mas ainda o piche é muito julgado pela sociedade”, revelou o artista.
 
A construção de um artista
 
Rafael contou que desde criança era apaixonado por grafite e foi quando ainda morava em Cárceres que ele teve o primeiro contato com a arte, aos 17 anos.
 
“Eu trabalhava em uma empresa em Cárceres que fazia estampas de camisetas. E teve uma feira em São Paulo, foi a primeira vez que eu viajei para fora do Estado. E nisso eu tive o primeiro contato real na minha frente. O meu tio pichava quando eu era criança, mas nada de grafite artístico”, relembrou o grafiteiro.
 
Reprodução
Rafael Jonnier
Obra lúdica do artista Rafael Jonnier
 
Ele encontrou no desenho uma forma de se expressar enquanto ainda era criança.
 
“Eu sempre fui uma criança elétrica, mas a minha terapia sempre foi desenhar. E quando eu começava a desenhar, já sentia a necessidade de ver o fim do desenho. Com 6, 7 anos, eu já fazia desenhos, desenhava pessoas. Sempre fui o diferente da família”, revelou o artista.
 
Porém somente há quatro anos que Rafael começou a praticar o grafite. Antes disso, ele passou por diversas experiências, mas sempre relacionadas ao meio artístico.
 
“Já faz cinco anos que estou em Cuiabá. E lá [Cárceres] eu trabalhava em uma empresa de comunicação visual. Sempre trabalhei nessa área criativa”.
 
Contudo, ele começou a sentir a necessidade de expandir os horizontes - foi quando se mudou para a Capital.
 
“Chegou um momento da minha vida em que eu tinha que sair da minha zona de conforto. Foi quando decidi vir para Cuiabá, que é uma cidade maior. O interior não estava proporcionando o que eu queria”, confessou Rafael.
 
Mesmo querendo mudar de vida, o grafiteiro ainda nem sonhava em ser artista. Ele queria mesmo era ser um designer.
 
“A ideia era fazer faculdade, tentar algo novo, mas sempre do lado criativo. Sempre tive os programas digitais, desde criança fiz curso. Minha mãe me estimulou. Vim fazer faculdade de design de interiores e trabalhei criando marca. Até pouco tempo eu ainda exercia a profissão de designer de interiores, mas hoje é só arte”, narrou o jovem.
 
Para Rafael, passar por essas experiências foi essencial para se construir como artista.
 
“São várias etapas para chegar aqui, são varias etapas que eu passei na minha vida e hoje eu misturo todas na minha arte”.
 
O artista plástico começou sua carreira pintando no estilo pop art, muito conhecido pelos trabalhos de grandes artistas como Andy Warhol e Basquiat.
 
“Nessa época eu estava tendo aulas sobre o movimento artístico de Nova York. Eu me apaixonei por aquele colorido. E me inspirei neles. Tem vários artistas no Brasil e no mundo que se inspiram na pop art. Aí eu comecei a pintar pop art”, revelou.
 
Mas, após dois anos no mesmo estilo, Rafael se viu descontente com sua situação.
 
“Eu não tinha uma identidade própria. Sou só mais um dentro da pop art. Precisava sair da zona de conforto”, disse o artista.
 
Foi nesse momento que surgiu o espaço para o jovem iniciar no grafite. Porém ele ainda tinha receio de explorar a arte na rua.
 
“Eu tinha muito medo de levar a minha arte para a rua porque não sabia o que ia fazer, não sabia como o público ia reagir. Eu ficava com muito medo porque estava sem experiência nenhuma na arte. Foi onde eu ganhei o primeiro spray do Babu, um amigo meu que grafita tem muitos anos. E assim eu comecei a pintar”, revelou Rafael.
 
Hoje, ele se tornou muito conhecido pelos seus desenhos lúdicos que remetem ao mundo dos sonhos.
 
“Tive a necessidade de criar um novo estilo que veio esse mundo lúdico. Porque, até então, como a galera começou a me conhecer através da pop prt. Eu precisava sair da zona de conforto. Precisava ser Rafael Jonnier, o artista, e não o artista que pinta pop art. Eu queria ter essa identidade visual”, afirmou.
 
Foi assim que surgiram seus personagens que estão espalhados pela Capital. Entre eles o Pescador de Sonho, muito reconhecido pelo seu bigode que relembra o artista Salvador Dalí.
 
“Primeiro veio o Pescador de Sonhos. Eu estava dormindo e veio uma cara quadriculada com um bigode. Era uma coisa que ia inovar, impactar. O nome eu escolhi porque veio de um sonho e meus avôs eram pescadores. A história que eu tenho influenciou muito”, revelou Jonnier.
 
Depois disso, surgiram outros personagens como a Princesinha do Rio, parceira do Pescador de Sonhos, o cachorro deles, Adobe Dog, e o Espírito Santo, que são asas e filtro de sonhos.
 
“Teve toda uma simbologia, um estudo para criar esses personagens. É um universo infinito que eu posso criar. Hoje eu encontrei minha identidade. É muito bom quando as pessoas nem veem a assinatura e já sabem que sou eu, pelos traços. Isso é muito gratificante”, disse Rafael.
 
Reprodução
Rafael Jonnier
O principal personagem de Rafael Jonnier, o Pescador de Sonhos, representado em Cárceres
 
 As dificuldades
 
Rafael acredita que os artistas de rua de Mato Grosso sofrem com o pouco apoio.
 
“O artista tem que correr atrás, porque se ele esperar Governo, Prefeitura, é muito difícil ter incentivo. A nossa população não foi ensinada essa questão da arte, que é essencial para a vida”, expôs o jovem.
 
E mesmo quando há espaço para o grafite nas instituições governamentais, os artistas ainda encontram empecilhos.
 
“Quando tem esse incentivo, é muito burocrático. Eles pedem muita coisa, tem que entregar uma pilha de documentação”, reclamou.
 
Então, onde pintar?
 
Para Jonnier, os melhores lugares para serem grafitados são aqueles que pedem por ajuda.
 
“Eu prefiro lugares abandonados ou que estão há muito tempo sem ter um cuidado. Vou transformar aquele lugar e melhorar para todo mundo”.
 
Ele revelou que a escolha da parede acontece quase como algo sobrenatural.
 
“Não é eu que escolho o lugar. É a parede que me chama. Então cada parede tem uma história. Cada parede passa uma mensagem”.
 
A exposição
 
Rafael se prepara para inaugurar a sua primeira exposição individual, que vai acontecer no dia 1º de março, na Casa do Parque.
 
Segundo ele, essa exibição, intitulada Pescando Sonhos, tem um apelo muito pessoal do artista.
 
“Essa é uma exposição muito profunda que eu conto histórias que eu já tive em sonhos, que eu já passei também. Traz muitas mensagens positivas, de evolução. É uma dedicação muito grande em cima dessa exposição”, revelou.
 
Jonnier acredita que essa exposição vai acontecer no momento certo da sua carreira.
 
“Eu sinto que nessa exposição estou mais preparado porque consigo me encontrar como artista”.
 
Com a “Pescando Sonhos”, o grafiteiro quer incentivar os cuiabanos a conhecer a arte de rua.
 
“Eu quero ter uma interatividade com o público. Aqui em Cuiabá eu percebo também que não tem essa cultura de consumir arte. Não estou falando de comprar, mas de estar envolvido. Eu quero atrair novas pessoas que vão começar a olhar a arte de outra forma”, finalizou.

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