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14/06/2022 - 10:18

Gefron: 'Tráfico atrai jovens pagando até R$ 5 mil por semana'

Por Thaiza Assunção

Mídia News

 (Crédito: Mídia News)
O lucro fácil em cima da atividade ilícita de tráfico de drogas é uma das principais “armas” usadas por organizações criminosas para convencer jovens a atravessar entorpecentes, como a cocaína, na fronteira entre Mato Grosso e a Bolívia. Uma atividade de risco que, na maior parte dos casos, termina em prisão ou morte.
 
De acordo com o comandante do Grupo Especial de Segurança na Fronteira (Gefron), tenente-coronel PM Fábio Ricas, a maioria das pessoas pegas atravessando drogas na fronteira é formada por jovens da região que são recrutados pelas organizações criminosas. O “trabalho” ilícito pode render até R$ 5 mil em uma semana. 
 
“A atividade de tráfico de cocaína e seus derivados é muito lucrativa, facilitando a cooptação dos jovens para o crime. O jovem recrutado chega a ganhar em uma semana, o que o trabalhador rural da região demora dois a três meses trabalhando para receber, algo em torno de R$ 5 mil”, disse em entrevista ao MidiaNews.
 
O comandante não vê falha do Estado no aliciamento desses jovens. Para ele, isso tem a ver com a índole de cada pessoa. "Tem pessoas que são recrutadas e tem pessoas que seguem o caminho correto". 
 
Fábio Ricas ressaltou que o cada vez mais o Estado tem aumentado a fiscalização contra o tráfico de drogas na fronteira, através do Gefron, que neste ano completa 20 anos. 
 
Na entrevista, o comandante ainda falou sobre  as penas previstas para os crimes de tráfico de drogas no Brasil, afirmando que é necessário rever a política de encarceramente para esses criminosos. 
 
Leia os principais trechos da entrevista: 
 
MidiaNews - Como está a estrutura do Gefron para o combate às drogas na fronteira? O que melhorou nos últimos anos?

Fábio Ricas – Hoje, temos uma estrutura física que é a mesma da criação, praticamente. Porém já temos projetos para reformas de todas as unidades e criação de novas unidades. Além da perspectiva de melhorias na estrutura física, na atual gestão tivemos aquisição de armamentos de última geração, utilizados pelas melhores forças policiais do mundo.
 
Tivemos um salto significativo também em termos de equipamentos tecnológicos, que nos auxiliam no trabalho de policiamento de fronteira, em especial, câmeras de monitoramento e câmeras com tecnologia OCR. Hoje, a nossa linha de fronteira tem 983 km de extensão e, por isso, somente com suporte tecnológico conseguimos ter efetividade nas nossas ações, tanto no caráter repressivo, quanto preventivo.
 
MidiaNews - As apreensões estão aumentando ou é apenas impressão? 
 
Fábio Ricas – Com certeza. Saímos em 2018 com indicador de aproximadamente 4 toneladas de apreensão de entorpecente. Em 2019, tivemos um avanço na apreensão, com 6,5 toneladas. Em 2020, saltamos para 14 toneladas de entorpecentes apreendidos. Em 2021, mantivemos as 14 toneladas. E este ano, de janeiro a maio, já superamos 6 toneladas. É 15% a mais em relação ao mesmo período do ano passado. Estamos em franco aumento em termos de produtividade.
 
MidiaNews- Apesar da repressão do lado de cá da fronteira, a impressão que há é que do lado de lá a produção de cocaína corre solta. O Brasil não precisa atuar de forma mais dura com a Bolívia?
 
Fábio Ricas – Concordo. Realmente, há essa necessidade de uma integração, de uma participação mais efetiva do lado boliviano nesse sentindo. Hoje, já existe um compartilhamento de informações das forças policiais.
 
Temos contato direto com as forças policiais bolivianas, em especial as unidades especializadas que atuam no combate ao tráfico de drogas.
 
Mas a gente vê que há uma necessidade, uma participação mais efetiva do Governo Federal brasileiro no sentido de exigir que o Governo Boliviano volte os olhos para essa problemática, porque isso traz consequências para o Brasil.
 
O tráfico de drogas alimenta as organizações criminosas e desencadeia uma série de outros crimes como homicídios, roubos, furtos, latrocínios, trazendo prejuízos à sociedade.
 
MidiaNews – Além disso, não acha que o Governo Federal deveria ser mais presente, ajudando mais os estados fronteiriços para evitar a entrada de drogas no Brasil?
 
Fábio Ricas – Já houve um avanço significativo na participação da União junto aos estados fronteiriços por meio do programa Vigia. Por meio desse programa existe hoje uma operação nacional denominada Hórus desde 2019 em todos os estados de fronteira. Mato Grosso desenvolve essa operação por meio do Gefron e unidades da Polícia Militar e Polícia Civil. E esse programa e essa operação vêm possibilitando diversos investimentos e custeio de operações. Nós recebemos do Governo Federal algo em torno de R$ 5 milhões desde 2019 entre custeio de operações e investimentos por meio de equipamentos e viaturas.
 
Esse programa tem sido um divisor de águas em relação aplicação de políticas públicas de segurança pública na faixa de fronteira pelo Governo Federal porque até então outros programas que existiram não trouxeram tanto eficiência e efetividade como tem sido por esse programa Vigia e a operação Hórus.
  
MidiaNews -  Qual o perfil dos traficantes que são pegos atravessando drogas pela fronteira?
 
Fábio Ricas – São pessoas da região que são cooptados, recrutados pelas organizações criminosas apenas para realizar a logística de buscar o entorpecente do lado boliviano e trazer para o lado brasileiro seja para os municípios próximos da região ou para os grandes centros.
 
MidiaNews – Por que esse “trabalho” é aceito?
 
MidiaNews
Coronel Fábio

Fábio Ricas - Atividade de tráfico de cocaína e seus derivados é muito lucrativa, facilitando a cooptação dos jovens para o crime. O jovem recrutado chega a ganhar em uma semana, o que o trabalhador rural da região demora dois a três meses de serviço, algo em torno de R$ 5 mil.
 
MidiaNews - O Estado falha quando permite que esses jovens sejam aliciados por bandidos? Para o senhor, qual a solução?
 
Fábio Ricas - Isso tem a ver com índole da pessoa. Tem pessoas que são recrutadas e tem pessoas que seguem o caminho correto. 
 
MidiaNews -  Uma tática dos traficantes é o emprego de motos para o transporte de pequenas quantidades de droga. Essa modalidade dificulta a prisão?
 
Fábio Ricas – Tanto a modalidade de moto como a modalidade de pé, que são comumente utilizados, com certeza, dificulta, principalmente, porque eles utilizam as chamadas cabriteiras, que são vias clandestinas criadas por meio de propriedades rurais justamente para desviar das rotas principais para tentar driblar a fiscalização.
 
E aí para fazer frente a esse tipo de ação criminosa, temos a patrulha de interdição de fronteira, que é justamente um trabalho de identificar essas rotas e realizar o policiamento nesses locais específicos.
 
MidiaNews -  Há relatos de ameaças a fazendeiros para que permitam o uso de suas terras?
 
Fábio Ricas – Isso era mais comum antigamente. Atualmente, não tem chegado para nós esse tipo de ameaça. Com a presença mais efetiva do Gefron, isso tornou-se mais difícil de acontecer.
 
MidiaNews - Não é frustrante correr perigo de vida combatendo o tráfico na fronteira, enquanto muitos usam as drogas de forma irresponsável, fomentando essa atividade criminosa?
 
Fábio Ricas – O operador de fronteira é ciente do seu trabalho. Sabemos que embora as pessoas consumam as drogas, causando diversos danos, as que retiramos é um ganho para a sociedade e isso nos motiva.
 
Qualquer pessoa tem conhecimento de algum parente, algum familiar, que passa pelo problema da utilização de entorpecentes. E, saber que estamos retirando uma droga de circulação, fará um bem direta ou indiretamente para a sociedade.
 
MidiaNews-  Além da drogas, um dos grandes problemas da fronteira também são os carros que são roubados aqui e levados para lá. Como está essa situação atualmente?
 
Fábio Ricas – Realmente, assim como o tráfico de drogas, o transporte de veículos é uma preocupação da Secretaria de Segurança, do Governo do Estado. É uma preocupação. porque é um patrimônio do cidadão de bem que é subtraído e, segundo, porque esse veículo é utilizado como moeda de troca na comercialização de entorpecentes.
 
Os números de recuperação de veículos têm aumentando consideravelmente ao longo dos últimos anos. Em 2020, foram 325 veículos recuperados. Em 2021, foram 397 e esse ano já apresentamos um aumento em relação ao mesmo período do ano passado. Além disso, o número de veículos roubados e furtados da Baixada Cuiabana teve uma queda de quase 30% em relação ao ano passado.
 
MidiaNews
Coronel Fábio

Os veículos que são recuperados na faixa de fronteira são oriundos principalmente de crime de roubo e furto de Cuiabá e Várzea Grande e de outros estados. E, também, veículos locados em nomes de terceiros, do golpe do seguro e com mandados de busca e apreensão.
  
MidiaNews -  A Bolívia ainda tem aquela legislação que regulariza carros sem origem?
 
Fábio Ricas – Não existe uma lei que regulariza os carros ilícitos, mas não há nenhuma legislação que restringe ou que obrigue a verificação se o veículo é ou não de origem ilícita. Então, qualquer tipo de veículo acaba sendo regularizado.
 
MidiaNews - Quais carros são mais visados?
 
Fábio Ricas – Antigamente existia uma demanda mais forte por caminhonetes, mas hoje qualquer tipo de veículo está sendo levado para lá. Veículos de carga, de passeio, SUVs.
 
MidiaNews - O senhor considera satisfatórias as penas previstas para os crimes de tráfico de drogas no Brasil?
 
Fábio Ricas – O que eu posso dizer é que a reincidência é muito grande relacionado ao tráfico de drogas. Em 2020, a gente verificou que mais de 90% dos criminosos que vieram a óbito, possuíam passagem criminal. É um fato. É necessário rever nossa política de encarceramento. De melhorar o encarceramento tendo em vista que a reincidência é muito grande com relação aos criminosos envolvidos em tráfico de drogas.
 
MidiaNews - Em muito países, existe a pena de morte para traficantes, inclusive para pequenos traficantes. O senhor defende a pena morte para traficantes no Brasil ao menos para os grandes traficantes?
 
Fábio Ricas – Eu não sei opinar sobre isso. Fato é que realmente o tráfico de drogas é um mal que traz severos prejuízos para a sociedade. Falar de pena de morte está muito distante para nós, principalmente por conta da nossa Constituição, que proíbe.
 
MidiaNews -  Recentemente houve denúncia de que policiais militares do Gefron teriam matado trabalhadores e os acusado de ser traficante. Como recebeu essa acusação contra a tropa?
 
Fábio Ricas – Isso já foi esclarecido tanto por meio de inquérito da Polícia Civil, tanto da Polícia Federal. Foi constatado por meio de perícia técnica de que houve um confronto armado no local. Eram pessoas que estavam realizando o tráfico de drogas e ao se depararem com a presença policial do Gefron deu-se início ao confronto armado em que os primeiros criminosos que estavam à frente vieram a óbito. A equipe policial reagiu para se defender.

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  • por joao, em 15.06.2022 às 06:27

    A bolivia é 3º pais da américa do sul que mais produzem cocaína, é a principal a economia do pais junto com Colômbia / Peru. Infelizmente as pessoas que são presas na região de Cáceres são os pequenos mulas, enquanto o patrão nem a mão coloca. Precisa mudar a lei de trafico e ser mais rígida a pena! Caso o contrário " só vai enxugar gelo ". Infelizmente é comum na nossa região e em Cáceres o numero de pessoas que são atraídos pelo lucro rápido que a droga trás, como dizem dinheiro fácil! Todos sabem que tem vários comércio das cidade que é usado para lavar dinheiro!

  • por Dias, em 14.06.2022 às 11:13

    Infelizmente a Bolívia não tem nenhum interesse em acabar com o tráfico de drogas, pois é o seu maior produto de exportação, maior fonte de divisas desse país. A região fronteiriça com MT (Cáceres) é uma ou talvez a mais pobre da Bolívia, favorecendo este crime, enquanto não houver uma política de desenvolvimento dessa região não vai mudar este cenário. Precisa do asfalto San Matias/Santa Cruz como início do desenvolvimento regional.

 
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