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10/05/2015 - 11:17

​Médico Juliano Canavarros aponta os benefícios da "redução do estômago" e avanços no setor

Por Lislaine dos Anjos

Bruno Cidade/MidiaNews

 (Crédito: Bruno Cidade/MidiaNews)
Membro titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica, o médico cuiabano Juliano Canavarros realiza cirurgias de "redução do estômago" desde 2001. Ele afirma, categórico, que já presenciou centenas de pacientes melhorarem radicalmente de vida – e até mesmo se "salvarem" – após optarem por técnicas de redução do estômago.
 
Defensor da tese de que a cirurgia bariátrica apenas deve ser escolhida quando o paciente se encaixa na faixa indicada – com graus de obesidade II, III e mórbida, por exemplo –, Canavarros afirma que ainda há muito preconceito e temor injustificável quanto ao procedimento, que evoluiu exponencialmente nas últimas décadas.
 
“O risco de uma cirurgia dessas é o mesmo de qualquer outra cirurgia, mas ainda é um risco muito controlado. Mas eu acredito que há, sim, um pouco de preconceito e muita desinformação sobre os benefícios do procedimento”, disse.
 
Formado pela Federal do Rio de Janeiro e com vários cursos de especialização em videocirurgias, no Brasil e no exterior, o cirurgião afirma que, por diversas vezes precisou dizer “não” para pessoas que buscam as cirurgias de redução de estômago por questões estéticas, que não se encaixam no perfil indicado e até mesmo para pais que tentam fazer seus filhos passarem pelo procedimento.
 
Em entrevista ao MidiaNews, Canavarros afirma que a ausência de bons hábitos alimentares é, em grande parte, a culpada pelo aumento da obesidade no país e afirma: a cirurgia bariátrica ajuda, mas não faz milagres.
 
“A gente fala que a cirurgia lhe dá a chance de você emagrecer e, a partir daí, você mudar seus hábitos. Não é um milagre. Eu opero pacientes todos os dias. Posso te falar com certeza: a cirurgia é 50% do tratamento. A outra metade é a mudança de hábito, é praticar atividades físicas e querer ser magro”, disse.
 
Confira abaixo os principais trechos da entrevista:
 
MidiaNews – Quando a cirurgia bariátrica é indicada? Qual o perfil do público que, em tese, precisa dessa cirurgia?
 
Canavarros – Há uma classificação internacional a respeito disso. Hoje existe uma coisa que a gente já até discute nos congressos que é uma “ditadura do IMC” [Índice de Massa Corporal], que é uma forma de você quantificar quanto de gordura existe depositada no corpo de uma pessoa. Como que você calcula o IMC? Você pega o peso e divide pelo quadrado da altura. Se o cidadão se enquadrar em um número maior que 35, somada a uma comorbidade, ele é um candidato para a cirurgia. O que é uma comorbidade? É alguma doença que a obesidade já está causando no organismo dessa pessoa, como é o caso da apneia do sono, diabetes. Vejamos a questão da diabetes, que é, na minha opinião, o que mais prejudica o obeso hoje em dia. Se você tem 35 ou acima de IMC, sua chance de desenvolver o diabetes já é comprovada mais de 20 vezes. Não dá para se falar em um peso específico que faça a pessoa ser indicada para a cirurgia, porque varia muito com a altura. Se você pegar uma pessoa de 100 kg ou até menos, como 80 kg, mas que é baixa, ela pode ter um IMC acima de 35. Somada a uma comorbidade, ela já tem condições de operar. Agora, é justo aplicar isso [essa fórmula] para o brasileiro? Não, porque esse padrão foi criado de nada científico. Poucos médicos tocam nesse assunto, mas esse foi um padrão diagnosticado em um corredor de um hospital norte-americano, feita para norte-americanos. Os indianos, percebendo isso, foram os primeiros a deixarem de lado essa classificação que não tem nada de internacional, porque é norte-americana ou europeia. E como o Brasil é fruto de uma miscigenação de raças, já há um entendimento na nossa sociedade de que você deva aplicar por aqui um IMC abaixo. Mas, como há um lobby dos planos de saúde para segurar isso e deixar só quem realmente está muito pesado, você segue aplicando essa teoria.
 
MidiaNews – Além do peso, a faixa etária é um fator determinante na hora de se fazer uma cirurgia?
 
Canavarros – Sim. A lei é muito clara. Hoje, a gente faz a cirurgia bariátrica em pacientes que tem de 16 a 65 anos. Essa é uma faixa considerada segura. Mas, eu já recebi aqui no meu consultório, uma ordem judicial para atender e realizar a cirurgia em uma criança de 13 anos. Mas era uma criança que ficava no quarto dela, não saía mais nem para almoçar, tinha um preconceito dela contra ela mesmo que a impedia de procurar até mesmo os entes de sua própria casa. Nem mesmo à escola ela ia mais. Hoje, você a vê fazendo balé, com uma vida social muito mais integrada.
 
MidiaNews – A questão estética, por si só, justifica a escolha pela cirurgia?
 
Canavarros – Vou dar um exemplo brincando, aqui: para o homem, não, mas as mulheres parecem ter um chip dentro da cabeça que, se elas estiverem magrinhas, o mundo fica cor-de-rosa, todos os problemas somem. A gente vê isso direto. Já o homem, quando procura a cirurgia bariátrica, já está “nas últimas”. A estética não justifica a necessidade da cirurgia, porque esse procedimento não tem esse fim. Mas também não vou mentir: melhora, para algumas pessoas a autoestima quando elas emagrecem lá seus 40 kg, mudando, inclusive, a sua feição. Isso é fato.
 
MidiaNews – Mas a procura pela cirurgia, por questão estética, é grande?
 
Canavarros – Sim. Tem muita gente que toma um “não” aqui. Se a gente analisar o grupo das mulheres, por exemplo, 20% das que procuram a cirurgia bariátrica não têm indicação clínica para fazer e a gente acaba orientando-as a procurar um nutrólogo, por exemplo, mas elas nunca ficam satisfeitas. Porque, vejam bem, se ela tem 32 de IMC, ela já está na obesidade grau I, mas está “cheinha” e quer resolver esse problema. E, para isso, tem muita coisa nova saindo no mercado. Por exemplo, a endocirurgia. Você entra no setor de endoscopia, o médico, usando um equipamento chamado laser de argônio, marca os locais do estômago onde os pontos precisam ser dados, e, por endoscopia, você consegue diminuir o tamanho gástrico para caber menos comida. Nós temos o equipamento já na clínica, mas não o utilizamos ainda, porque estamos aguardando a Anvisa e o Ministério da Saúde autorizarem o procedimento. Mas nos Estados Unidos, por exemplo, já se faz esse procedimento. Aqui no Brasil ainda é um procedimento experimental, mas, dentro de mais um ano, ele deverá estar sendo aplicado aqui.
 
MidiaNews – Então, se não há indicação clínica, o senhor veta?
 
Canavarros – Olha, é difícil, porque tem gente que quer burlar, sair do plano de saúde, e aí nos cabe orientá-la a procurar uma assistência psicológica, enfim.
 
MidiaNews – Para esse público que não possui indicação clínica, mas quer fazer por pura estética, a cirurgia apresenta um risco maior?
 
Canavarros – Às vezes, ela pode emagrecer demais. Se você fizer um procedimento disabsortivo, ela pode ficar muito magra e acabar doente por causa disso. Agora, se ela fizer uma “sleeve”, por exemplo, ela não chega a ficar doente, apenas magra demais. Mas, se você pegar os exames dela, cálcio, vitaminas A, B, D, B12, estão normais.
MidiaNews – É exagero dizer que a cirurgia bariátrica acaba salvando vidas?
 
Juliano Canavarros – De maneira alguma. A cirurgia bariátrica salva vidas, mesmo. Isso já está comprovado. Há  um estudo sueco que acompanhou filas de pessoas aptas à cirurgia; parte delas opera, outra não. Entre as que optam por não operar a quantidade de gente que falece é muito superior. Principalmente hoje, com essa evolução tecnológica que houve do material e de equipamentos. O paciente, quando as cirurgias começaram, precisava ficar oito dias internado, com sonda no nariz. A situação era meio medieval. Já hoje, o paciente com 36 horas está de alta. A diferença é muito grande.
 
MidiaNews – Na sua opinião, ainda existe um certo preconceito, um temor na sociedade, em relação à cirurgia?
 
Canavarros – O temor existe e é injustificável porque, para um paciente que sofre de obesidade grau II ou grau III, o risco de uma cirurgia dessas é o mesmo de qualquer outra cirurgia. Mas ainda é um risco muito controlado. Então, eu acredito que há, sim, um pouco de preconceito. Porque a maioria das pessoas que são magras se sentem confortáveis em apontar alguém e falar que “fulano é gordo, ele tem um problema, eu não”. Aquela pessoa eu fica recebendo aquela desinformação, ela começa a sedimentar na cabeça dela que ela é um problema para a sociedade, começa a ter baixa estima, não tem opinião. Mas ela sofre de um problema endócrino, com um hormônio que é produzido no estômago e indo para o cérebro dela e a mandando comer.
 
MidiaNews – O Brasil vive atualmente um crescimento alarmante da obesidade. O senhor atribui isso a quê? À falta de critério na alimentação, de consciência sobre a importância de uma alimentação saudável?
 
Canavarros – É a comodidade mesmo. Hoje, quando você entra em qualquer lugar, você não bate o olho em uma fruta, mas sim em carboidrato, açúcar, ou seja, tudo aquilo que você põe na boca e vai lá no cérebro e produz uma coisa chamada serotonina, que é uma espécie de uma droga do bem estar. Você come um doce e se sente bem por causa de uma droga que é produzida pelo seu próprio corpo.
 
MidiaNews – Os casos dos pacientes que lhe procuram são, na maioria, por causa de obesidade causada por alimentação inadequada?
 
Canavarros – Sim. Na grande maioria. Tem casos em que o paciente chega aqui com obesidade mórbida e me fala: “Doutor, eu quero operar, mas não quero mudar uma vírgula do meu hábito alimentar”. Eu aperto a mão dele e desejo boa sorte - porque ele pode procurar, mas não vai encontrar nenhum profissional que dê jeito no seu caso. O americano consegue esse paciente e o apelida de “bite eaten”, que é aquele paciente da "mordidinha": ele até não faz um “pratão” de comida, mas passa o dia todo beliscando, comendo alguma coisa. Esse daí é terrível. Você faz uma cirurgia e daqui a três anos ele está voltando a ganhar peso. Daí você muda para uma cirurgia mais severa, como um Bypass com alça longa, em que ele corre o risco de desabsorver, de ficar com fezes com mal cheiro e ossos mais frágeis, e ele volta a engordar. Daí você tem que ir para uma cirurgia ainda mais severa, que é a suite duodenal, e ele não para de comer.
 
MidiaNews – Para o senhor, é exagero dizer que muitas pessoas estão “morrendo pela boca”?
 
Canavarros – Não, porque é verdade. O alimento em excesso faz mal. Aqui é comum a gente ver uma pessoa que já passou uma cirurgia bariátrica com outro profissional, volta a ganhar peso, e vem aqui atrás de ajuda porque acha que a culpa é do outro profissional. Aí você começa a conversar com ele e percebe que o hábito alimentar é totalmente sem critério e que a prática de atividade física é zero.
 
MidiaNews – Falta consciência às pessoas que querem fazer a cirurgia bariátrica de que não basta passar pelo procedimento, mas também mudar – em alguns casos, radicalmente – seu estilo de vida?
 
Canavarros – A gente fala que a cirurgia lhe dá a chance de você emagrecer e, a partir daí, você mudar seus hábitos. Não é um milagre. Eu opero pacientes todos os dias. Posso te falar com certeza: a cirurgia é 50% do tratamento. A outra metade é a mudança de hábito, é praticar atividades físicas e querer ser magro.
 
MidiaNews – Qual o risco apresentado por uma cirurgia bariátrica?
 
Canavarros – Hoje ela se assemelha ao risco de uma cirurgia convencional. Óbvio que estamos falando de categorias de pacientes, que variam de acordo com a idade, o IMC, para determinar a curva de risco. Com IMC acima de 40, a linha já é um pouco inclinada. Passou de um IMC de 50, quando o paciente já está fora da obesidade mórbida e se enquadra na superobesidade, a linha de risco é praticamente vertical.
 
MidiaNews – É por isso que alguns pacientes precisam emagrecer antes de se submeter a cirurgia?
 
Canavarros – Sim. É o outro caso da indicação do balão. Tenho um paciente de Várzea Grande que já me procurou por quatro vezes, tenta me “cantar” para fazer a cirurgia dele, mas eu não faço, porque já disse a ele que ele vai entrar na sala de cirurgia e morrer.
 
MidiaNews – E morre, exatamente, por quê?
 
Canavarros – Geralmente, de embolia pulmonar. A cirurgia fica perfeita, mas a pessoa que é muito obesa, com IMC acima de 40, tem uma chance muito grande de desenvolver uma coagulação dentro do vaso sanguíneo. Então, esse trombo que é formado dentro de uma safena, de uma veia femoral, sobe para o pulmão e mata.
 
MidiaNews – Quais são os principais tipos de procedimentos cirúrgicos para redução do estômago existentes no Brasil?
 
Canavarros – Vamos dividir em três categorias: existem as restritivas, as mistas e as disabsortivas – sendo que as cirurgias dessa última categoria estão praticamente abolidas no Brasil, apesar de que a suite duodenal [técnica disabsortiva] é a que melhor corrige diabetes no mundo. Você consegue uma correção de diabetes de 92% em uma cirurgia dessa, mas o brasileiro não aceitou bem, porque é aquela cirurgia em que você deixa pouco intestino para absorver os nutrientes, vamos dizer assim. Então, quem faz essa cirurgia, precisa ter um banheiro praticamente de uso exclusivo, porque o odor é muito forte, muito desagradável.
 
Já na categoria das restritivas a gente tem a Sleeve, que é a mais realizada nos Estados Unidos e também no Brasil. O que a Sleeve faz? Seu estômago é como uma sacola e você, pura e simplesmente, desce, durante a cirurgia, uma mangueira com um molde para o seu estômago, e faz a ressecção de uma parte dele. Você destaca essa parte do estômago. Um dos motivos pra você retirar essa parte do estômago é porque naquelas cirurgias em que você apenas desviava, como a Bypass, há vários trabalhados já mostrando a possibilidade de se desenvolver câncer. Então, todo mundo que fez Bypass há alguns anos, que está com o estômago está lá, sem uso, há mais de sete anos, pode pegar um avião e seguir para São Paulo para fazer uma enteroscopia [exame que permite a visualização do intestino delgado] – aqui em Mato Grosso ainda não se faz esse procedimento – porque você pode encontrar uma displasia [anomalia] ou alguma outra coisa. Então, é uma coisa que me preocupa. Como vou fazer um procedimento cirúrgico em um paciente sabendo que daqui a sete, oito anos, eu posso estar causando a ele um mal maior?
 
O segundo motivo para retirar essa parte do estômago na Sleeve é porque, décadas atrás, se achava que o estômago amassava a comida para o intestino absorver. Mas os americanos descobriram que são produzidos hormônios no estômago, sendo um deles a grelina, que é o hormônio da fome. Ele sai do seu estômago, vai lá na sua cabeça, na área de saciedade e lhe estimula a comer. Hoje, quem faz a cirurgia, depois de uma semana chega no consultório e fala: “Doutor, não sinto fome alguma. As pessoas têm que me lembrar de comer”. É impressionante.
 
MidiaNews – E isso não é um problema?
 
Canavarros – Não é um problema porque, essa parte gástrica que é retirada, é daquela época em que as pessoas não tinham freezer, nada, e a pessoa precisava acumular o alimento. É a parte que distende [dilata] do seu estômago. Hoje, a gente precisa, na verdade, ter a consciência de que o alimento em excesso mata.
 
MidiaNews – Continuando, dentro da categoria das cirurgias restritivas, existem mais quais procedimentos?
 
Canavarros – Aqui, além da Sleeve, existe somente a banda gástrica, que é uma espécie de cinta de silicone que você coloca na transição do esôfago para o estômago. Esse procedimento está praticamente em desuso, não deu certo no Brasil. Ainda vê-se, no Brasil, alguns profissionais insistindo, mas você percebe, às vezes, que ele não está sendo sincero, possui alguma ligação com quem produz a banda, participa de algum lobby. Infelizmente, isso acontece. Um dos países que insiste na banda e que fala bem dessa cirurgia em congressos é a Austrália. Mas, enfim, no Brasil, esse procedimento não teve bons resultados. Tem bastante gente que o aderiu e continua obeso. Eu, por exemplo, por uma questão de convicção, nunca coloquei uma banda gástrica, porque nunca gostei de colocar dentro de alguém algo que fosse estranho ao seu corpo. É a cirurgia mais fácil de fazer, mas eu nunca gostei. É uma questão de conseguir colocar a cabeça no travesseiro e dormir.
 
MidiaNews – E os procedimentos mistos são quais?
 
Canavarros – Essa categoria se restringe ao Bypass, que é uma cirurgia que, durante muito tempo, dominou o mercado das cirurgias de obesidade.
 
Nela, você retira uma parte do estômago, deixando o que hoje corresponde a 5%do tamanho de um carimbo o seu estômago. Daí, você corta o intestino, sobe e o liga a essa “bolsinha” que restou. O grande problema dessa cirurgia é que ela se trata de uma “invencionice médica”. Ninguém nasceu com essa estrutura de organismo. Uma criança que nascesse com esse estômago pequeno ligado diretamente ao intestino, na época de hoje, não estaria mais viva. É uma cirurgia que eu ainda sou obrigado a fazer, porque se o paciente chega aqui e tem alguma restrição que o impede de passar pela cirurgia, eu sou obrigado partir para o Bypass. Mas o estômago cortado fica ali, isolado, você não retira, e, depois de uns sete anos, pode desenvolver um câncer ali.
 
MidiaNews – E por que não se retira?
 
Canavarros – Os defensores desse procedimento alegam que, se o paciente tiver algum problema, eles conseguem resolver, porque a Bypass, assim como a suite duodenal e algumas outras técnicas, são reversíveis.
 
MidiaNews – Nesse caso, apenas a Sleeve não é reversível, então?
 
Canavarros – Se você pesquisar, verá que a maioria dos sites apontam a Sleeve como uma cirurgia irreversível, mas com o passar do tempo, há uns 15 anos, você vê que o estômago é igual um balão e pode dilatar, distender.
 
MidiaNews – Qual o custo de uma cirurgia tradicional, como a Sleeve, caso seja feita fora do plano de saúde?
 
Canavarros – Em torno de uns R$ 30 mil. Algumas pessoas acham caro, mas aí você avalia que o Brasil é o 2º maior país que realiza a cirurgia de obesidade, mas não tem nenhuma empresa nacional que fornece os equipamentos necessários. Tudo vem da Covidien ou da Johnson & Johnson, que são duas multinacionais.
 
MidiaNews – Até agora, falamos dos procedimentos cirúrgicos. E no caso do famoso “balão”? Quando ele é recomendado?
 
Canavarros – Eu acho que o balão ainda tem algumas aplicações. Por exemplo, veio uma mãe aqui com uma criança de 11 anos. Eu me neguei a operar, porque eu só operei uma adolescente até hoje por causa de uma decisão judicial. Nesse caso, eu acho interessante o balão, porque ele força uma perda de peso e ajuda a criança. Você coloca o balão e enche ele com até 700 ml de um líquido azul, quando ele já está dentro do estômago, para preencher o espaço. Esse líquido é necessário porque, se o paciente urinar e aparecer a cor azulada, ele já sabe que o balão estourou e deve correr para procurar o médico dele. E para ser retirado, é fácil, geralmente por endoscopia: aspira tudo e puxa o balão. Um procedimento tranquilo.
 
MidiaNews – O balão ocupa quanto de espaço no estômago?
 
Canavarros – Depende, porque o tamanho do estômago também varia de acordo com a raça, sexo. Ele ocupa uma área que seria cerca de 40%, não chega a mais do que isso. Mas, hoje, já se estudam outras formas de balão, porque desse jeito ele ainda pode dar complicações ao paciente. Porque ele é uma coisa pesada. Coloque 700 ml de peso sobre a sua mão e não mova ela de lugar. Após 24 horas, você vai perceber que a pressão começa a gerar uma ferida. E é isso que ocorre lá dentro, porque o balão força a área do seu estômago. Já houve o caso de uma policial civil que usou o balão e ele não causou apenas uma úlcera, mas rompeu o estômago dela, caiu dentro da barriga e ela teve que abrir o tronco para retirar o balão de dentro da barriga.
 
MidiaNews – Quais são os passos necessários para que o paciente passe até estar apto para uma cirurgia?
 
Canavarros – Existe um protocolo. Se eu pudesse orientar alguém que se interessa em fazer a cirurgia, diria para, antes de tudo, entrar no site da Sociedade Bariátrica, que é nacional, e veja quem está habilitado pela sociedade a realizar a cirurgia, quem fez as provas. Porque, assim como tem gente que se diz cirurgião plástico sem ter nenhuma capacitação, qualificação ou reconhecimento da sociedade, tem gente fazendo cirurgia bariátrica que não faz parte da sociedade. Existe não só aqui em Cuiabá, mas no mundo inteiro. O problema é que, aqui no Brasil, se o cara está inscrito no CRM [Conselho Regional de Medicina], ele pode fazer. Eu, Juliano, posso ir entrar em um hospital e operar a cabeça de alguém, porque a lei me garante. Agora, se acontecer alguma coisa, aí sim pode se questionar. Mas eu realmente não entendo como tem gente assim porque, mesmo após 25 anos operando, não me sinto capaz de ir em um hospital e abrir a cabeça de alguém. Uma coisa é você ter que agir em uma situação de emergência, para salvar a vida de alguém. Mas não é o correto.
 
MidiaNews – Após escolher o profissional, quais os próximos passos?
 
Canavarros – Na hora da consulta com esse profissional, ele irá avaliar se você está dentro daquilo que eu expliquei da “ditadura do IMC”, que diz se você está dentro dos padrões estabelecidos como aceitáveis para operar. A partir daí, você vai passar por todo um protocolo que vai desde exame de sangue, endoscopia, ultrassom, que irão dar dados importantes para saber qual a melhor cirurgia indicada para aquele paciente. Na sequência, ele deve passar por médicos especialistas em pulmão, coração, endocrinologista, nutrólogo.
 
  MidiaNews – E esse pré-operatório leva quanto tempo, em média?
 
Canavarros – Depende muito do tempo hábil, mas se a pessoa estiver confortável para correr atrás de tudo, dentro de uns 15 dias ela já encerrou essa fase. Aqui na clínica nós estamos tentando aglutinar tudo, então em uma sala tem um nutrólogo, na outra um cardiologista, na outra um pneumologista, então você vai marcando tudo em um lugar só. E nós fizemos isso exatamente para acelerar para as pessoas, principalmente quem vem de fora, do interior ou de outro estado. Aqui, em média, dá pra fazer tudo em menos de 15 dias.
 
MidiaNews – Estando apto, já vai para a cirurgia?
 
Canavarros – Não, daí o paciente passa pela perícia do plano de saúde. Nós estamos com problemas com alguns planos de saúde por causa da demora, e o paciente até acha que deu algum problema, mas é mais porque eles colocam um perito para fazer perícia de tudo. Isso leva, em média, um mês. Aí, estando tudo bem, ele passa pelo anestesiologista, que vai explicar a ele tudo o que ele vai sentir com a anestesia geral. Finalizada essa etapa, o paciente está apto para passar pela cirurgia. Na média, uns dois meses de pré-operatório.
 
MidiaNews – No caso dessa cirurgia que o senhor mais faz, que é a Sleeve, quanto tempo dura?
 
Canavarros – Ela é toda feita por vídeo e dura aproximadamente 40 minutos. Antes, na época dos cortes, quando não havia a cirurgia por vídeo, eu demorava mais de horas para ligar os vasinhos. Hoje, nós temos um equipamento, vindo da Alemanha, de última geração, então é tudo muito rápido. Você esmaga o tecido, tira o edema local, e aí vai com a lâmina cortando [o estômago], e a máquina já passa grampeando em seguida. Sempre com três linhas de grampo e, além disso, a gente ainda passa o fio, costurando.
 
MidiaNews – Quantas cirurgias o senhor faz, em média, por dia?
 
Canavarros – Com os equipamentos que temos, daria para fazer até 12 cirurgias de obesidade por dia. Mas a média é de três por dia, no máximo.
 
MidiaNews – E como é o pós-operatório? É algo traumático?
 
Canavarros – Geralmente, ele dura 36 horas. E aí, quando eles vão para casa, seguem com todo o tratamento, porque já passaram pela nutricionista, que explica qual é o tipo de caldo que pode tomar.
 
MidiaNews – E quantos dias o paciente precisa passar ingerindo apenas líquido?
 
Canavarros – São 30 dias. Primeiro ele recebe um copinho de café com água de batata. Isso é um teste. Se o estômago aceitar bem o líquido, você passa para um outro caldo, quando bate tudo no liquidificador e passa o caldo pela peneira plástica, bem fininha, para não deixar passar resíduo. Porque o estômago está cortado, grampeado e costurado. Mas, se você colocar algo sólido aqui dentro, você está correndo um risco, está dando um tiro no pé. E ainda assim, tem gente que é terrível. Mesmo passando por psicólogo, psiquiatra, ainda vai e come carne, pipoca, casca de uva, depois não sabe o que está ocorrendo, porque está passando mal. Na verdade, até mesmo comprimido precisa ser amassado antes de tomar.
 
MidiaNews – E o que é a Síndrome de Dumping? Todos que fazem a cirurgia de redução do estômago estão sujeitos a isso?
 
Canavarros – O Dumping acontece quando o alimento passa do estômago para o intestino de uma forma muito rápida, ou seja, você não tem os receptores para glicose, para coisas gordurosas, como você tem no trânsito normal do organismo. Os primeiros artigos sobre a cirurgia Sleeve afirmavam que ela não causava Dumping, mas após alguns anos operando, ficou comprovado que ela causa a síndrome, mas de forma mais leve. Agora, o Bypass pode levar você a ter um Dumping incapacitante. Às vezes você tem que deitar a pessoa, colocar as pernas dela para cima, porque senão ela desmaia. Esse é o caso de você ter que reverter o processo.
 
MidiaNews – Há o risco de se emagrecer demais? Quanto tempo dura esse processo de emagrecimento?
 
Canavarros – Emagrecer demais é algo difícil de acontecer na Sleeve, porque você tem toda a área absortiva normal. Mas o processo de emagrecimento dura, normalmente, um ano e meio. E, normalmente, no final disso, a pessoa volta a ganhar de 10 a 15% do peso que perdeu. Até isso, é aceitável. Se ultrapassar essa porcentagem, tem que ver se o paciente está recebendo acompanhamento. Porque, todos os trabalhos mostram que os pacientes que seguem com acompanhamento médico, não tem essa recaída.
 
MidiaNews – E quais as chances reais de, por causa de uma cirurgia bariátrica, a pessoa acabar por desenvolver outros tipos de doença, como anemia?
 
Canavarros – Sim. Na Sleeve, são raríssimas as vezes. Mas no Bypass, não, porque você isola o duodeno e é ali que você absorve o ferro. Então, você fica com a capacidade de absorção de ferro prejudicada e precisa ir direto ao hospital para tomar Noripurum na veia.
 
MidiaNews – Cabe o argumento de algumas pessoas que, ao se submeter a cirurgia bariátrica, você troca uma doença, no caso a obesidade, por outra?
 
Canavarros – Em algumas situações, eu acho que sim. Mas não é uma frase que cabe para todas as técnicas. Se você fizer uma suite duodenal, por exemplo...É como diz aquele ditado: “o que não mata, aleija”. Ela é quase isso, por isso que ela não se deu bem no Brasil. Hoje, apenas 3% das cirurgias bariátricas aplicam essas técnicas mais graves, disabsortivas.
 
MidiaNews – Pelas suas contas, quantas Sleeves você já fez em sua carreira?
 
Canavarros – Desde 2008, mais de 1,3 mil Sleeves. Em média, faço umas 25 Sleeves por mês. Tem gente que vem, por incrível que pareça, da Angola, da Alemanha, da Irlanda, de outros estados.
 
MidiaNews – Em sua opinião, o nível de excelência em equipamentos e técnicas aqui de Cuiabá deixa a desejar em relação aos grandes centros?
 
Canavarros – Não, porque a gente tem participado de muitos congressos, encontros e a sociedade cobra, também.
 
MidiaNews – E no caso, das mulheres, há algum risco real caso se engravide depois de ter feito a cirurgia bariátrica?
 
Canavarros – Na Bypass, sim, porque ela tem a disabsorção e você corre o risco de não passar para a criança os nutrientes que ela precisa, então pode desenvolver um parto prematuro, a criança pode ficar na UTI Neonatal por um tempo, enfim. Já na Sleeve você tem um ganho de peso normal da gravidez, e volta a emagrecer em seguida. Mas, de uma forma geral, no caso da Sleeve, se pede à paciente para que aguarde pelo menos um ano antes de engravidar. Já no caso da Bypass, o tempo de espera tem que ser maior.
 
MidiaNews – Que tipo de recado o senhor daria às pessoas que estão nesse grupo, que precisam da cirurgia, mas sentem medo da cirurgia?
 
Canavarros – Acho que, ao invés de dar ouvidos ao vizinho, confiar apenas no que lê na internet, procure alguém que está capacitado. Alguém que realmente tenha qualificação para avaliar a sua situação e esclarecer todas as suas dúvidas antes de formar uma opinião. Agindo desta maneira, de modo racional, a situação certamente ficará mais clara.

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  • por Laudai, em 10.05.2015 às 20:02

    Estou com 58 dias de cirurgiado com este profissional de excelente qualidade, deveria muitos médicos passarem por um estágio com ele para aprenderem a tratar as pessoas com segurança e atenção. Digo que foi uma das melhores ações tomadas que já fiz, não tive nenhuma complicação e me sinto ótimo ao usar uma roupa ou melhor, ir a loja e encontrar o que vestir. Deixei o medicamento da pressão. Tudo melhorou mas claro ainda em adaptação. Porém deve se entender que gordo e igual viciado, não existe ex viciado, o que existe e ex usuário, assim e o obeso, se não mudar a cabeça, nada dará certo, come se para viver, e não se vive para comer.

  • por José Antonio caetano cabral, em 10.05.2015 às 17:41

    eu em pessoa, fiz a cirurgia, e me identifico muito na entrevista, consegui apos longos dois anos de espera realizar pelo SUS 100% o pré operatório e o pós, agora com 10 messes e 50 kl a menos, é muito importante, a questão não esta só emagrecer, mas temos cabeça de gordo..............., e isto só tempo e auto ajuda conseguimos transcorrer em uma vida saudável e maravilhosa, operar é fácil novas técnicas avança, mas a cabeça é propiá hj recomendo a todos que faça a cirurgia mas com acompanhamento pré e pós operatório, tenho uma equipe medica por de trans de mim, e muitos amigos, somos um grupo unido de gordos e ex gordos kkkkkkkkkkkkkk. são apenas 8 médicos e as avaliação hj são de trés em trés messes, troquei 6 comprimidos por dia, de pressão, diabetes, colesterol,por 2 vitaminas. estou maravilhado muito bem com a vida. operei no hospital metropolitano várgea grande MT.

 
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