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04/01/2015 - 16:08 | Atualizado em 04/01/2015 - 16:13

Poconeanas aprendem técnica peruana e fazem telas com retalhos

Por Evânia Costa

A Gazeta

 (Crédito: A Gazeta)
Mães, donas de casa, artesãs e empreendedoras. Em Poconé, a 104 km de Cuiabá, um grupo de mulheres descobriu no artesanato fonte de renda e reconhecimento. Paisagens do Pantanal e de festas folclóricas, como a Cavalhada e os Mascarados de Poconé e a festa do Congo de Vila Bela, se transformam em telas feitas com recortes de diversos tecidos, através de uma técnica peruana chamada arpilleria.

Apesar de a venda das peças ser garantida aos turistas, somente 4 das mais de 30 fundadoras permanecem na Associação Retalhos de Arte, criada em maio de 2007. Nesses anos, outras mulheres se uniram ao grupo, mas o número não chega à metade da formação original.

“Nós trabalhamos bastante, mas a renda é muito pouca. Por isso que muitas desanimam. A renda é baixa e toma muito tempo. O Sesc Casa do Artesão compra o ano inteiro, o Espaço do Artesão de Poconé, e os turistas das fazendas. Mas, às vezes, não tem pessoas para fazer porque é muito demorado o serviço”, conta a presidente do Grupo, Rita Lúcia de Paula Arruda, que fala da falta de apoio.

“Se a gente ganhasse material já ficava mais fácil. A gente tem que tirar 30% da nossa produção para comprar material. Aí numa tela de R$ 200, a gente recebe R$ 160. Se a gente recebesse tudo até animaria mais para fazer. Tem que gostar e saber costurar. Aqui também é como uma terapia. A gente faz isso aqui e esquece de tudo, até dos problemas”.

Dos diversos tipos de materiais usados nas telas (TNT, tricoline, elastano), Rita conta que o veludo não é encontrado no Brasil.

Os tecidos peruanos têm texturas, estampas e cores diferenciadas que são usadas no recorte dos animais e da vegetação. As artesãs chegaram a procurar, mas não acharam o material nas grandes fábricas de tecelagem do Rio Grande do Sul, o que poderia ter barateado os custos de produção.

Os desafios não desanimam Benedita Marilza de Souza. Contratada pelo município através do programa Mais Educação, ela acaba de concluir o 3º ano do EJA (Educação de Jovens e Adultos).

Os trabalhos em arpilleria contribuem com o orçamento em casa. “Ajuda na renda porque eu sou viúva. Sou contratada como merendeira da Mais Educação, não sou efetiva. Então aí, quando não estou no colégio estou costurando. A gente vende e já entra um dinheiro para ajudar”.

Quando o assunto é o reconhecimento do trabalho, Benedita lamenta que somente os turistas e os moradores da Capital reconhecem o valor das telas. “Às vezes, as pessoas daqui de Poconé querem comprar, mas acham caro.

Mas a gente não tem como fazer menos porque o material vem de longe. Nós não temos no Brasil, só no Peru. Tem que manda o dinheiro para lá para poder vir”.

Para equilibrar as contas e manter a atividade que tanto gosta, Ozélia Maria Corrêa Costa Mendes, faz tricô, tece redes e pesca.

“Agora neste momento não pode pescar. O rio está enchendo, os peixes desovando. A gente dá um tempo para eles também. E tem que mexer dos 2 lados. Meu marido fica no Pantanal. Agora está viajando com o gado por causa da enchente”, conta Ozélia.

Dona de casa e pescadora, Marileide do Prado, cria o neto de 3 anos. Em casa, o gosto pela arpilleria também ajuda com a renda. “Não um salário, mas dá dinheiro. Assim, quando o marido não recebeu ainda. Eu já recebi, pago a luz”.

Há cerca de 1 ano, Maria Fátima Proença de Arruda e Livia Cristina Falcão de Arruda, mãe e filha, entraram no grupo Retalhos de Arte. Maria Fátima conta que morava no pantanal e decidiu se mudar para cidade quando o marido faleceu.

A artesã mais antiga da associação, que é madrinha do esposo dela, as convidou para conhecerem a técnica e ingressarem no grupo.

“No dia quando eu vi os trabalhos, eu falei que não ia conseguir fazer. Ela me incentivada. Aí foi indo, foi indo e consegui. Eu mais costuro do que corto. Quem corta os bichinhos para mim é a minha filha. Ela corta e eu vou costurando. Fazemos assim muito rápido.

Mas eu não vivo só disso. Se fosse só disso, não sobreviveria. Eu sou pensionista, conheço um pouco do Pantanal. Tenho uma fazendinha lá também”, diz Maria Fátima.

Uma das fundadoras do grupo e atual vicepresidente, Lediana do Carmo Lemes Nascimento lembra que a associação começou quando uma empresária da região, dona de uma pousada, adquiriu uma tela com a técnica de bordado peruana e foi organizado um curso para as mulheres de Poconé.

Apesar dos muitos compromissos em casa cuidando dos filhos e do marido, na igreja, na escola à noite concluindo o magistério, Lediana não larga o artesanato.

“Acho que fica quem gosta de fazer. Tem que ter muita paciência, tem que gostar de fazer. Dá uma renda sim quando a gente pega e tem mais tempo para fazer”.

Achar tempo é um dos desafios de Rosangela Maria Cavalheiro, que faz parte da associação há 6 anos e está recém-casada.“Trabalho de casa, cuidar de marido. Isso atrapalha um pouco. Mas dá dinheiro sim. Trabalhando bastante dá”.

Além de esforço e dedicação, Maria Ondina dos Santos Martinotto revela outra característica importante: vocação.

“Vale a pena. Mas para fazer esse trabalho precisa de dedicação, criatividade e paciência. Tem que saber costurar um pouquinho. Desde pequena sempre gostei de arte. Sempre estava criando alguma coisa, pintando, bordando, dançando na escola. Com 14 anos comecei a fazer cursos de artes, de costura, de trabalho manuais. Depois de 2005, eu formei em artes plásticas”, lembra Maria Ondina, que está na lista de fundadoras do grupo.

Casada com um pesquisador e produtor do Distrito de Cangas, a 20 km de Poconé, Maria Ondina divide seu tempo cuidando da família, dos animais, das plantas frutíferas e medicinais, e produzindo as peças de arte que tanto se orgulha.

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