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20/07/2012 - 16:53

ENGODO: OSS é um verdadeiro fiasco em Mato Grosso revela Jornal

Por Isadora Spadoni e Andhressa Sawaris Barboza/CIRCUITOMATOGROSSO

O enfraquecimento do sistema público de saúde e o seu desinteresse por parte dos gestores, perceptível desde o governo Maggi – que fechou hospitais no interior do Estado e superlotou os da Baixada Cuiabana – e acentuado por Pedro Henry que entregou, em efetivo, unidades públicas de saúde de Mato Grosso à gestão particular, apresenta hoje a pior face da herança privatista: as propostas foram “nobres” e os custos com a pasta aumentaram mas, em contrapartida, o atendimento não teve nenhuma melhora – os rumores são de que piorou – e a falta de zelo e transparência nunca foram tão assumidas. “Em todo lugar que buscamos atendimento [na saúde pública], somos humilhados”. O desabafo foi feito por Maria Pereira, a “Netinha”, 60, enquanto aguardava o atendimento do esposo no Hospital Metropolitano. Vedete do ex-secretário de Saúde do Estado Pedro Henry, a unidade foi criada com a promessa de reduzir o número de pacientes à espera de cirurgia, em especial a ortopédica, grande responsável por ocupar leitos nos prontos-socorros. O contrato inicial com o Instituto Pernambucano de Assistência à Saúde (Ipas), qualificado como Organização Social de Saúde (OSS), assinado em abril de 2011, previa a execução de 500 cirurgias/mês pelo valor global aproximado de R$ 31,4 mi – o que equivale a cerca de R$ 2,7 mi mensais. O valor recebido pelo hospital, que dispõe de 52 leitos, é duas vezes maior que o recurso destinado ao Pronto-Socorro de Cuiabá e policlínicas, que totalizam 320 leitos. Como se não bastasse, o hospital está muito aquém das expectativas – executar cirurgias ortopédicas, em especial as de alta e média complexidade: as 500 cirurgias prometidas podem até ser executadas, mas algumas nem deveriam ser contabilizadas como tais. Trata-se de pequenos procedimentos ortopédicos e até cirurgias de baixa complexidade, como retiradas de apêndices, que são considerados – e principalmente, pagos – da mesma forma que as complicadas cirurgias. A abrangência das cláusulas contratuais, que não estipulam a complexidade dos procedimentos ofertados pela OSS, permite tais abusos e a má aplicação do dinheiro público. Médico do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), Celso Vargas afirma que o comportamento é “digno” de uma instituição privada que, como tal, visa lucros e “dispensa maiores complicações”. “As OSS evitam o paciente que traz complicações, pois os gastos são maiores”. O servidor acusa que o Hospital Metropolitano não tem recebido pacientes de alta complexidade. “Eles ganham um incentivo maior do Sistema Único de Saúde e alegam que só entra paciente regulado, mas não entendemos essa liberdade que eles têm de selecionar os pacientes. Isso vai contra a ética e as normas legais”, afirma. O pedreiro Odair Aparecido Silva, 38, é prova cabal de que o Metropolitano não tem cumprido suas obrigações. Depois de sofrer um acidente de moto e passar 15 dias no Pronto-Socorro, Odair está há 64 dias à espera de uma cirurgia no tendão do braço. “Eles disseram que o médico vem do Paraná para fazer a cirurgia e que seria preciso juntar 12 pessoas com a mesma necessidade que a minha. Já têm 12 pessoas esperando e o médico ainda não apareceu”, revela o pedreiro, que além da dor, também se queixa das dificuldades financeiras por estar afastado do trabalho. “Recebia R$ 2 mil e agora tenho apenas a ajuda do INSS, que é de um salário mínimo”, comenta. Já a dona de casa Marilda Silva, 43, ouviu outra desculpa. Depois de cair da escada e fraturar a coluna e o colo do fêmur, ela espera há mais de 35 dias por uma cirurgia no Hospital Metropolitano. “Eles me disseram que falta chegar uma placa de São Paulo. Mas em meio a tanta tecnologia, por que a demora? Antigamente ela viria de mula, mas hoje existem aviões, não faz sentido”. Propaganda é a alma do negócio Mesmo depois das falsas promessas do Estado em aprovar as OSS, o engodo do Metropolitano ainda é desmentido pelas ações de marketing: no site do Ipas, a organização gestora informa que o Hospital Metropolitano conquistou “Certificação Ouro em esterilização hospitalar”. A assessoria de marketing presente no local fez questão de enfatizar à reportagem sobre a agilidade e qualidade na prestação de serviços – que segundo informou, atende às metas compactuadas com o governo. Além de não priorizar as vítimas de traumas ortopédicos, desde o início da gestão privada, a OSS também reduziu esses atendimentos, após um remanejamento, e, em abril deste ano, passou a oferecer intervenções bariátricas. Transparência zero - Falta de transparência não é queixa apenas dos usuários do Sistema Único de Saúde. Para a presidente do Sindicato dos Médicos (Sindimed), Elza Queiroz, as concessões são um mistério. “Parece que existe uma nuvem negra sobre a saúde de Mato Grosso, pois não sabemos o que acontece, nem o quanto de dinheiro é realmente investido”, afirma. A conselheira do Conselho Regional de Medicina de Mato Grosso (CRM-MT) Iracema Queiroz também tem o mesmo discurso. Segundo ela, até o momento a Secretaria de Estado de Saúde não respondeu a nenhum questionamento levantado pelas entidades que compõem o Conselho de Saúde. “Ninguém sabe o que foi pago ou se tiveram termos aditivos aos contratos. Não dá para ter ideia, a não ser pelas notícias que recebemos de colegas que estão dentro dos hospitais. E elas não são nada boas”, revela. A reportagem também não obteve respostas da Secretaria de Estado de Saúde. Sete unidades estão nas mãos de OSS Várzea Grande, Rondonópolis, Cáceres, Colíder, Alta Floresta, Sorriso e Sino – essas unidades totalizam o montante de R$ 230 milhões em contratos com o governo. O Metropolitano não é a única laranja podre no cesto: no Hospital Regional de Sorriso (distante 420 quilômetros de Cuiabá), a OSS Instituto Nacional de Desenvolvimento Social e Humano iniciou suas atividades em abril deste ano de forma conturbada. A transição dos gestores contrariou grande parte dos servidores, que se demitiram em protesto pelo atraso de salários e desacordo com a nova administração. Apesar da redução no quadro de profissionais, a OSS continua recebendo o repasse de R$ 3,9 milhões por mês do Governo do Estado, como previsto em contrato. A presidente do Sindimed relata que um dos médicos concursados que atuavam no hospital sofreu perseguição por se posicionar contra. “O servidor trabalha há vários anos em um hospital, presta serviços ali e, de repente, ele não serve mais”, conta. Situação semelhante aconteceu na gestão do Hospital Municipal de Nova Mutum, recentemente concedido a uma OSS. “Nesse caso, temos acompanhado um quadro ainda mais preocupante, tanto que o sindicato vai impetrar mandado de segurança para manter o direito dos profissionais de continuarem trabalhando”. Segundo Elza, as organizações não contratam profissionais pelas vias trabalhistas, ou seja, os médicos não trabalham com registro em carteira, apenas prestam serviços.
 
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