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14/01/2011 - 10:34

Centro de Direitos Humanos Dom Máximo Biennès divulga nota a respeito da situação do Cadeião de Cáceres

Por Da Redação

O Centro de Direitos Humanos Dom Máximo Biennès divulgou uma nota a respeito da situação do Cadeião de Cáceres. Leia abaixo: "O Centro de Direitos Humanos Dom Máximo Biennès (CDHDMB), organização não governamental de defesa e promoção dos direitos humanos, no uso de suas prerrogativas constitucionais de atuar na garantia da prevenção e/ou na eventual violação ou ameaça aos direitos fundamentais da pessoa humana, apresenta o seu parecer sobre a situação da cadeia pública de Cáceres, diante do conflito que se instala naquela unidade prisional. No dia 3 de janeiro de 2011, este Centro de Direitos Humanos tomou conhecimento de denúncias por parte de mães de presos e de matérias em vários jornais de veiculação local e estadual, relatando que a cadeia se encontrava em clima tenso, em risco iminente de ocorrer uma rebelião e que os direitos dos presos estariam sendo desrespeitados. As denúncias apresentadas: maus-tratos; revistas violentas (dando conta de que houve uso de gás de pimenta por policiais militares, onde um detento teve a perna fraturada durante a ação); transferência de presos sem a devida comunicação aos seus familiares, inclusive presos não condenados, sem obedecer aos critérios legais, dificultando receber apoio familiar elemento importante à ressocialização; negligência; alimentação de péssima qualidade; superlotação (a cadeia tem capacidade para 200 e hoje conta com 450 presos); péssimas condições de higiene e insalubridade; proibição de entrada de alimentos por familiares de presos; falta de condições de habitabilidade, com estrutura física precária nos aposentos; deficiência no abastecimento de água e estrutura de saneamento precário no interior do presídio. O Centro de Direitos Humanos em conjunto com a Comissão de Direitos Carcerários da OAB, o Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua – MNMMR e a Defensoria Pública, na busca de se inteirar da situação colocada, intervieram no sentido de estabelecer um diálogo profícuo envolvendo o diretor da cadeia, os agentes carcerários e os presos. O diálogo foi estabelecido e as partes ouvidas. Primeiramente foi ouvida a Comissão Provisória dos agentes carcerários de Cáceres, na sequência houve uma reunião com o diretor do presídio que desencadeou uma reunião com os presos representantes das alas. Na reunião com os presos, estes confirmaram as denúncias e pediram providências das autoridades na resolução do conflito. Foram ouvidos, no decorrer dos trabalhos também, policiais que fazem a segurança do presídio, que reclamaram da falta de condições de trabalho na unidade prisional. Denunciam as péssimas condições para a realização dos serviços externos na guarita que, por não existir proteção alguma durante a vigilância os agentes policiais ficam o tempo todo expostos ao sol e à chuva. Afirmam ainda, que uma policial já ficou doente em função dessas condições péssimas de trabalho. Sem pormenorizar as verificações feitas através das partes envolvidas (presos, diretor, agentes carcerários e entidades), consideramos que as denúncias veiculadas são graves e contundentes, caracterizando tortura e tratamento desumano e degradante, merecedoras, portanto, de uma rigorosa apuração dos fatos e os responsáveis, se comprovadas, devidamente responsabilizados, não inviabilizando, no entanto, ações reparadoras imediatas às situações de violação dos direitos humanos denunciadas, com vista a assegurar os direitos de cada preso e a preservação da sua dignidade. Contudo, é preciso ir além da situação pontual verificada. Considerando que o sistema prisional brasileiro apresenta falhas graves, com uma estrutura arcaica e falida, em que a “ressocialização” é mera caricatura, onde surrupia direitos e fere a dignidade humana. Por isso, é imperioso que esta situação seja vista com a amplitude necessária, considerando as suas complexidades e dimensões dos problemas existentes, para então viabilizar os encaminhamentos e resoluções plausíveis, em prazos mensuráveis. Nunca é demais recordar que os direitos humanos são interdependentes, o que significa que realizam-se juntos, estão ligados uns com os outros. A realização de um direito ajuda os outros; enfraquecer um direito também enfraquece os demais, pois, estão inter-relacionados, daí a necessidade de tratar a questão prisional de modo a contemplar todas as dimensões e necessidades humanas, isto é, todos os direitos inerentes à pessoa humana devem ser assegurados, respeitando-se as restrições legais, referentes ao regime de privação da liberdade. Isto requer, portanto, a implantação de uma política pública de Estado que vise a melhoraria na qualidade do atendimento nos centros de detenção de Mato Grosso, combinando medidas legislativas, administrativas, judiciais e outras pertinentes. Portanto, é imprescindível a implantação de mecanismos eficientes e eficazes como os previstos no Protocolo Facultativo à Convenção das Nações Unidas contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, adotado pela Assembleia Geral das Nações Unidas em dezembro de 2002 e ratificado pelo Brasil, através do Decreto Presidencial nº 6.085, de 19 de abril de 2007. A implementação do Comitê estadual contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes no Estado é indispensável, pois, permite uma abordagem nova e realista para prevenir as violações de direitos humanos nos centros de detenção do Estado. A constituição deste instrumento inovador proporcionará a ativação de um sistema de monitoramento que visa submeter os locais de detenção ao escrutínio externo e assim reduzir o risco potencial da ocorrência de tortura e de outros mas-tratos. A gravidade desta prática deplorável é descrita pelo Instituto Interamericano de Direitos Humanos, da seguinte forma: “A tortura constitui uma das violações mais degradantes dos direitos fundamentais dos seres humanos. Destrói a dignidade das pessoas, degradando seu corpo e abrindo feridas, muitas vezes irreparáveis, em sua mente e em seu espírito. As conseqüências nefastas dessa terrível violação dos direitos humanos estendem-se à família das vítimas e a seu círculo social. Com a prática da tortura os valores e princípios sobre os quais se assentam a democracia e toda a forma de convivência humana perdem seu significado”. Portanto, o banimento incondicional da tortura e de outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos e ou degradantes constitui uma obrigação internacional de todos os funcionários do Estado. Para a comunidade internacional, a tortura é uma das afrontas mais terríveis e abomináveis à dignidade humana. Não obstante o repúdio internacional, constata-se que esses abusos intoleráveis continuam a acontecer no nosso Estado, país e no mundo. Esta constatação, no Brasil, é corroborada pela ONU em relatório que saiu em set/2008 que analisa a alta taxa de mortalidade e recomenda reforma na Polícia Civil, na Polícia Militar, na corregedoria de polícia, na medicina legal, nas ouvidorias, na promotoria pública, no judiciário e na administração carcerária: “Muitas vezes, os integrantes das forças policiais contribuem com o problema das execuções extrajudiciais ao invés de ajudar a solucioná-lo. Em parte, existe o problema relevante dos policiais em serviço que usam força excessiva e praticam execuções extrajudiciais em esforços legais e contraproducentes para combater o crime. Mas também existe o problema dos policiais que não estão em serviço que se congregam para formar organizações criminosas que também participam de assassinatos”. Desta forma, entendemos que a Convenção das Nações Unidas contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes oferece uma sólida estrutura legal para combater essas práticas, cabendo ao Estado observar suas obrigações de proibir, prevenir e punir tais práticas. Ainda assim, devemos lembrar que essa nova abordagem, consagrada no texto do Protocolo Facultativo à Convenção contra a Tortura, baseia-se na idéia de que, quanto mais abertos e transparentes forem os centros de detenção, menores serão os abusos ali cometidos. Vistos que esses locais são, por definição, interditados ao mundo exterior, as pessoas privadas de liberdade estão vulneráveis e particularmente expostas à tortura e a outras formas de tratamento desumano ou degradante, assim como as demais violações dos direitos humanos. Nestes termos, o Centro de Direitos Humanos Dom Máximo Biennès pede às autoridades competentes: 1) Que todas as denúncias ocorridas na cadeia pública de Cáceres, sejam rigorosamente apuradas, com a devida transparência e se comprovadas, que os responsáveis por tais práticas abusivas e/ou omissão sejam devidamente punidos na forma da lei. 2) Que o governo do Estado de Mato Grosso, na sua competência e responsabilidade adote, imediatamente, por seus órgãos auxiliares, medidas de correções urgentes às violações denunciadas tais quais: superlotação do presídio, sendo que a unidade está habilitada para atender 200 e hoje se encontra com 440 detentos; alimentação e higiene precária; ambiente insalubre; práticas de abusos, violência e tortura; insuficiência de agentes de vigilância externa; ausência de programas eficientes de ressocialização e readaptação social; falta de assistência médica e fornecimento de medicamentos; sistema de tratamento de esgoto precário provocando mal-estar e doenças nos funcionários, presos e comunidade local; transferência de presos sem a devida comunicação aos seus familiares, dificultando o processo ressocializador; falta de condições de trabalho para os agentes carcerários e policiais militares: falta de comunicação por parte da direção e demais instâncias prisionais para com os que se encontram dentro do presídio. 3) Que o governo do Estado de Mato Grosso implemente, de imediato, o Protocolo Facultativo à Convenção contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, a fim de prevenir práticas abusivas e melhorar as condições de detenção no Estado. 4) Que o governo do Estado de Mato Grosso, reúna as condições estruturais necessárias à implementação do Programa Nacional de Direitos Humanos – PNDH3, na perspectiva de avançar concretamente na qualidade do atendimento nos centros de detenção do Estado. 5) Que o Poder Judiciário, nos limites da sua competência, realize visitas regulares aos centros de detenção do Estado, em especial na unidade prisional de Cáceres, visando avaliar permanentemente as condições em que as pessoas privadas de liberdade estão detidas e, com base na situação concreta observada, formulem recomendações práticas e realistas e assim estabeleça diálogo com as demais autoridades competentes para sanar os problemas detectados. 6) Que o poder público e instituições envolvidas envidem esforços no sentido de viabilizar a organização das famílias das pessoas que se encontram privadas de liberdade, na perspectiva de fortalecer as ações de ressocialização e reinserção social, apoiando efetivamente aquelas que se encontram em situação de vulnerabilidade social. Cáceres, 12 de janeiro de 2011 Centro de Direitos Humanos Dom Máximo Biennès Edson Penha Mendes"
 
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