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21/11/2010 - 10:53

Descalvados renasce, majestosa

Por Da Redação

A chalana bem longe se vai, descendo lentamente no remanso das águas serenas do rio Paraguai. O destino é a histórica Fazenda Descalvados, localizada a 100 quilômetros de Cáceres. Entre as infinitas curvas, em meio a um verde exuberante, um coral de pássaros vai anunciando a aproximação de visitantes nesse santuário ecológico em pleno Pantanal de Mato Grosso. Construída em 1886, seu primeiro proprietário foi João Carlos Pereira, que a recebeu por doação da Coroa por ter lutado na Guerra do Paraguai (1864/1870). Não se sabe ao certo a origem do nome Descalvados. O professor do Departamento de história da Unemat (Universidade de Mato Grosso), Domingos Sávio da Cunha Garcia, autor do livro ‘Os Belgas na Fronteira Oeste do Brasil’, explica que, “aparentemente o nome é uma corruptela de Escalvado, denominação de uma elevação montanhosa à margem do rio Paraguai pouco acima da fazenda, que era chamada de Morro do Escalvado até meados do século 19 e que hoje é denominado de Morro Pelado. De Morro do Escalvado a Descalvados, foi o processo de acomodação de palavras pela utilização popular constante”. Apogeu e decadência Com um rebanho de 200 mil cabeças de gado e capacidade de abate de 20 a 30 mil rezes por ano, a especialidade da Descalvados era a produção de charque bovino voltado para o comércio europeu. O professor Domingos Sávio explica que “a fábrica surgiu em 1883. O argentino Rafael Del Sar criara, tempos antes, uma charqueada, como tantas que existiam em seu país, destinada ao abate de gado e à produção de carne em conserva. Em 1881, o uruguaio Jaime Cibils Buxareo comprou o empreendimento de Del Sar e, para manter o empreendimento no coração do Pantanal, foi obrigado a contrair muitas dívidas e, não conseguindo honrá-las, decidiu vender a fazenda. Só na segunda tentativa, em 1895, a venda de Descalvados foi realmente efetivada. O comprador foi um grupo de capitalistas belgas, organizados numa empresa sediada em Antuérpia – a Compagnie des Produits Cibils. Começou aí uma operação que faria de Descalvados a porta de entrada para uma tentativa de instalação de uma colônia belga no Oeste do Brasil, na fronteira com a Bolívia. À frente do projeto, a intenção de Antenor Alves Santos Júnior é fazer uma junção de história, arqueologia, fauna, flora e pesquisa científica com o ecoturismo Em 1940, a Descalvados foi nacionalizada por Getúlio Vargas e as terras foram para o homem de confiança do presidente da República em Mato Grosso, Filinto Muller, e o agrimensor Carlos Vandoni de Barros. Daí por diante, a história correu sem muitas novidades até a morte de Luis Lacerda, proprietário da Descalvados até os anos 1990. Depois disso, a fazenda ficou quase abandonada, mantida precariamente graças aos esforços solitários de um funcionário do atual proprietário – um dos herdeiros”. Apaixonante Foi nesse cenário de desolação, que o empresário Antenor Alves dos Santos Júnior descobriu a fazenda. “A primeira vez que passei na Descalvados, em 2004, achei linda e, em 2008, fazia passeios de helicópteros decolando daqui”, conta. Piloto de aviões desde os 17 anos, Antenor já tinha um barco de pesca de luxo e ficou quatro dias na fazenda só olhando. A proposta de parceria acabou sendo feita pelo dono da área e o arrendamento por 12 anos foi feito em outubro de 2009, com 2000 hectares e com direito a explorar turisticamente o restante da propriedade. A princípio, a intenção do empresário era somente transformar as construções em ruínas da fazenda em pousada. Ao percorrer com mais atenção o local, contudo, as surpresas foram surgindo. “Eu não sabia do valor histórico da fazenda. A arquitetura dos prédios e os móveis antigos escondiam uma história fascinante”, confessa. A viagem para Descalvados começa com a descida do rio Paraguai, a partir de Cáceres, numa confortável chalana Essas revelações deram uma nova dimensão ao empreendimento. O próximo passo foi obter o aval da Secretaria de Estado de Cultura para a reforma dos prédios – tombados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em 2001. Força-tarefa Com a autorização do Estado, Antenor Júnior tratou de contratar profissionais altamente gabaritados para as obras de restauração. Um deles foi o paranaense Pedro Ribeiro Filho, de 68 anos, que, mesmo apesar da idade, é chamado carinhosamente por todos de “Pedrinho”. É ele o responsável pelo trabalho de restauração de cada detalhe da arquitetura belga predominante. Pedrinho torna-se um menino ao falar da empreitada. “O que mais me impressionou foi a igreja. Ela tem muitos detalhes e a gente tem que descobrir a cor original das coisas. Vai ser muito custoso, por isso tem que ter muito carinho”. Outro apaixonado pelo trabalho é o analista ambiental com 20 anos de profissão Mário de Castro. “O mais fascinante da Descalvados é a sua história, especialmente por causa da questão indígena”, conta. Responsável pelo licenciamento ambiental e implantação da rede de esgoto, Mário toca no ponto nevrálgico do empreendimento: o equilíbrio ecológico. “Estamos às margens do rio Paraguai e nossa maior preocupação é não contaminá-lo”. Castro também explica que será usado o sistema de estratigrafia – valeta que possibilita visão das urnas funerárias existentes no local. O biólogo Raul José Vieira Neto, há 37 anos funcionário do zoológico da Universidade Federal de Mato Grosso, tinha uma missão especial em sua primeira visita à fazenda Descalvados - descobrir um pequeno roedor de nome pitoresco: tuco-tuco. De acordo com Raul, esse animal cava túneis de até 80 centímetros de profundidade como refúgio e precisa ser mais estudado. “Temos que saber qual o equilíbrio que ele nos dá”. Depois de 30 anos, o biólogo está de volta à fazenda justamente para fazer um levantamento da fauna e da flora e estudar o comportamento animal para o centro de pesquisa disponível às universidades interessadas. “Se não houver um trabalho de educação ambiental e limite da ação humana, é prejudicial. É preciso determinar normas com épocas e horários rígidos para a visitação”, conclui. Na fazenda, além dos safáris diurnos ou noturnos, os hóspedes poderão contar com voos panorâmicos num moderno helicóptero À frente do projeto, a intenção de Antenor Alves Santos Júnior é fazer uma junção de história, arqueologia, fauna, flora e parte científica com o ecoturismo. “Queremos ser uma referência. Não faço questão de matador de peixe. Quero o turista que quer se divertir”, afirma. Há sempre a preocupação mais do que pertinente dos impactos ambientais gerados por empreendimentos em áreas ecologicamente sensíveis. Questionado sobre o tema, o engenheiro florestal e analista ambiental do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, José Geraldo Magela Ângelo, responde: “Todo empreendimento pode causar impactos sejam eles diretos e indiretos sobre o meio ambiente, tanto que dependendo do porte é necessário o licenciamento ambiental, observando-se para tal a legislação ambiental nos três níveis de um possível licenciamento: federal, estadual e municipal”. Especificamente sobre a Descalvados, ele afirma: “O turismo tem promovido a geração de emprego e renda em diversos países desenvolvidos e subdesenvolvidos onde a preservação ambiental é o que garante o fluxo intenso e constante de visitantes. O turismo neste caso necessita do meio ambiente preservado para se perpetuar”. A viagem para Descalvados começa com a descida do rio Paraguai, a partir de Cáceres, distante 219 quilômetros de Cuiabá, numa confortável chalana. Imponente, o rio impressiona tanto pelas maravilhas do Pantanal quanto pela piscosidade. Na fazenda, além dos safáris diurnos ou noturnos, os hóspedes poderão contar com voos panorâmicos num moderno helicóptero com capacidade para quatro passageiros.
 
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