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15/06/2015 - 08:32

Os dois extremos da vida

            Durante a nossa existência, desfrutamos  de diferentes experiências   sempre entre os dois extremos da vida, ora de intensos  questionamentos e descobertas,  ora de significativa maturidade e calmaria, em consonância com a fase  em que vivenciamos. Quando jovens, pensamos em aproveitar a vida ao máximo, sorvendo cada  minuto como se fosse o último. Ao passo que na  fase madura, quase sempre nos assustamos, com o adiantado  do tempo decorrido e enfrentamos dificuldades para entender e assimilar  o final de ciclo  que paulatinamente  se aproxima. 

           Quando as pessoas  envelhecem,  se tornam introspectivas e se voltam  para o passado, tentando de alguma forma reativar e usufruir de toda beleza e alegria  “experenciada” no tempo passado, buscando desenvolver  recursos internos para enfrentar  o futuro,   que  traz  em si  a incerteza e a verdade existencial que limita e delimita as novas etapas futuras.

             Os idosos   geralmente  projetam o futuro bem como suas realizações   na perspectiva familiar  que o cercam : na pessoa  dos filhos,  netos , bisnetos, buscando identificar e alcançar seus objetivos, realizações e satisfações  nos  projetos de  vida  traçados  pelos entes familiares próximos. 

    Por outro lado, para os jovens a morte é um tema remoto e muito distante,  no seu momento intensivo de vida. A existência  para eles é  infinita  e traz latente em seu bojo a alegria e a vitalidade existencial, própria  desta fase, rica em determinação, coragem e intensa  em expectativa de realizações.  

               Para os idosos, a  sensação é que a caminhada pode ser interrompida  a qualquer tempo em função  do extenso percurso decorrido. Assim,  frente ao tempo limitado que se apresenta, passam a olhar   em  direção à  janela do passado, revendo  fatos importantes  e se alimentando de experiências  que  geralmente  os motivam e conferem  mais sentido ao seu  caminhar. Quase sempre vivem de retrospectivas, fixos às  experiências que deram mais sentido a sua vida, tentando dessa forma driblar  os desafios impostos  pela idade e  que se ampliam  dia após  dia. 
        
Apesar da  morte constituir um fato natural, certo, inevitável, comum e indistinto a todos, ninguém  se prepara para recebê-la.  O medo  do desconhecido e da derradeira  viagem, desencadeia  sensações   de inseguranças  e apegos que prejudicam a caminhada espiritual das pessoas. Apesar dos   “reencarnacionistas” defenderem a tese que a vida não acaba com a morte, e que esta é  a libertação  do corpo material e que a vida prossegue, comumente  se observa,  que na realidade ninguém esta preparado para dar esse passo, de retorno definitivo  à   pátria  espiritual.

             Certa vez numa roda de   amigos, que  costumeiramente costumavam "jogar conversa fora" em longas discussões  políticas,  filosóficas nos momentos  comuns de lazer, abordamos o tema  velhice como pauta central da discussão. Curioso perceber que a maioria  dos participantes dessa roda de conversa, estavam  numa faixa etária similar e muito próxima a  dos sexagenários, o que de certa forma  despertava entre todos, maior  interesse e atenção  para o assunto, fluindo a abordagem  de forma fácil e tranquila, e enriquecida pelas variadas  opiniões, sugestões,depoimentos  bem como, modelos  de projetos para uma velhice  saudável e feliz .

               Lembro-me com detalhes , de um forte  depoimento de um dos integrantes do grupo,  que  defendia a  tese   de finalizar seus dias ao lado da amada, companheira de todos os projetos de sua vida, sua cara metade, curtindo  diariamente  a essência  de um  amor eterno, verdadeiro  e duradouro  que superou todos  os revezes de  uma vida a dois.  Com  sabedoria e confiança  de quem vivenciou uma relação amorosa gratificante e satisfatória, descrevia aos presentes  o resultado  dos  bons momentos de uma existência regada continuamente  por afeto e pela  pretensão  de que somente a morte, fato inevitável e imutável   os separariam.

Assim,  comentou sobre o planejamento e projeto elaborado,  com uma riqueza  de detalhes assustadora. Nesta perspectiva, finalizaria   a fase mais vulnerável  da sua vida, num espaço, de clima ameno, agradável,  longe do tumulto da cidade grande, onde as  belezas naturais fossem  exuberantes  e permanentes, suficientes  para alimentar, acolher, referendar  e habitar  um casal com características   e peculiaridades comuns  da idade mais avançada. 
            
A parte mais importante   e marcante daquele depoimento não se ateve  somente na preocupação  com os detalhes requeridos pela  infra estrutura física básica e conforto necessário  à mobilidade diária  do casal, mas sobretudo   ao carinho, a cumplicidade, ao querer bem e a atenção  dedicada a um projeto de vida  a dois, que deixou  evidente a proposta afetiva maior que era a de viver  intensamente, cada minuto ainda   restante ,como se fosse o último da sua vida, reforçando  a tese cristã   "do até  que a morte nos separe", algo  raro, grandioso e significativo para a atualidade onde  esse sentimento normalmente  enfraquece  e se perde na caminhada.
            
  Feitas  as considerações sobre a maneira simples  de olhar  a vida, argumentou com a sabedoria , de quem tinha  bagagem suficiente para compartilhar com   as pessoas, a importância  de nascer, saber  viver e renascer com a dignidade, singeleza e sintonia  de um ser identificado  com o significado maior da vida: Deus.
       
O certo é que  ficou evidente, não  possuir  uma receita ou mesmo uma cartilha que possa  ensinar e nortear  o viver bem, mas, instrumentos eficazes e indispensáveis  interiores  capazes  de desenvolver no ser, valores  como a humildade, aceitação  e respeito  às   diferenças   individuais de cada um,  ricos na capacidade de  perdoar, amar e viver sem limites para sonhar. Imprimir