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27/04/2022 - 15:07

O voto aos 16 anos é facultativo, mas o compromisso com a democracia não!

O Brasil, nos seus 522 anos de existência, dentre outras coisas, passou por diversas transformações na sua configuração geopolítica, econômica e social, nas relações de trabalho e na participação do povo na vida política, em especial das mulheres, que só conquistaram o direito ao voto facultativo em 1932, convertido em obrigatório em 1965.

O país sobreviveu a períodos alternados entre a democracia e regimes ditatoriais, sendo que o último deles perdurou por longos 21 anos, de 1964 até 1985. Esse período foi marcado pela violência. Foram inúmeros assassinatos, pessoas desaparecidas e muitas pessoas exiladas em outros países.

Segundo dados da Comissão da Verdade, instituída pela Lei n. 12.528/11, entre os anos de 1964 e 1985, 210 pessoas foram dadas como desaparecidas, sendo localizados apenas 33 corpos, e 191 pessoas foram mortas. Essa Comissão apontou 377 pessoas como os responsáveis diretos e indiretos pela prática de tortura e assassinatos durante a ditadura militar no Brasil. No entanto, não se tem notícia de que algumas dessas pessoas sofreram alguma punição, diferentemente do que ocorreu no Chile, onde os algozes da ditadura militar prestaram contas à justiça.

Mas o que o direito ao voto facultativo aos 16 anos tem a ver com isso? Eu arrisco a dizer que tem tudo. Isso porque a democracia brasileira não foi dada ao povo; ela foi conquistada com muita luta, com o sangue e com a vida de muitas pessoas, dentre elas, muitos jovens.

O processo de luta que deu fim à ditadura militar na década de 80 deixou marcas profundas e irreparáveis. Quanto a isso, não há lei, anistia ou perdão que vá mudar a ordem cronológica e a autoria dos crimes praticados – eles existiram e mancharam a história do país.

A luta do povo brasileiro no movimento Diretas Já deu início a um processo de ruptura com a ditadura militar. A Emenda Constitucional n. 05/83 das Diretas Já propunha a alteração na Constituição para permitir que as eleições presidenciais de 1985 acontecessem de forma direta, ou seja, pelo voto popular – o povo deveria escolher o seu representante –, mas não foi aprovada pelo Congresso Nacional. Eram necessários 320 votos, e a Emenda obteve 298, motivo pelo qual as eleições presidenciais de 1985 acabaram acontecendo de forma indireta, e o presidente da república foi eleito por um Colégio Eleitoral composto por senadores, deputados federais e delegados eleitos em todos os estados.

Os movimentos populares, estudantis, culturais e sindicais não arrefeceram e foram fundamentais para o processo da Constituinte, que aconteceu nos anos de 1987 e 1988. As conquistas e os avanços ocorreram em diversos setores, com a aprovação do texto constitucional em 1988. O volume de direitos e garantias fundamentais, sociais e políticos, dentre outros, fez com que a Constituição de 1988 fosse chamada de “Constituição Cidadã”.

Entre os direitos políticos conquistados pelo povo, em especial, pelos estudantes secundaristas, destaca-se a aprovação da emenda do voto facultativo aos 16 anos, que obteve 355 votos favoráveis, 98 contrários e 38 abstenções, sendo, portanto, aprovada com um número bastante expressivo de votos. O voto aos 16 anos é um direito assegurado no art. 14, § 1º, II, “c”, e a garantia desse voto foi fundamental para a manutenção do Estado Democrático de Direito, previsto no art. 1º, parágrafo único, ambos da Constituição Federal de 1988.

Hoje, no Brasil, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE https://www.tse.jus.br/eleitor/estatisticas-de-eleitorado/estatistica-do-eleitorado-por-sexo-e-faixa-etaria), mais de 1 milhão de jovens com menos de 18 anos já fizeram o seu título e poderão votar nas eleições de outubro de 2022. Aqueles que ainda não fizeram o título, terão até 4 de maio para fazê-lo, inclusive os jovens que completarão 16 anos até o dia 2 de outubro de 2022, data do primeiro turno das eleições.

Nesse sentido, é importante reafirmar que a garantia do voto aos 16 anos, ainda que de forma facultativa, possibilita à juventude participar da vida política do país e definir seus rumos. Significa, sobretudo, uma possibilidade de cobrar políticas públicas efetivas de educação, saúde, cultura e lazer para a juventude.

Hoje, pelo Brasil afora, muitos jovens abraçaram um movimento de conscientizar outros jovens para que procurem a Justiça Eleitoral a fim de tirar o título de eleitor e assim garantam a participação nas eleições de 2022. Esse movimento vai ao encontro do que o Brasil espera de sua juventude em um momento tão crítico da política nacional.

Votar, além de ser uma obrigação para quem já tem acima de 18 anos e ser facultativo para os jovens acima de 16 anos, é um gesto de compromisso com a democracia e respeito com a história de mulheres e homens que lutaram e perderam suas vidas por ela. Cabe, portanto, às famílias e as escolas, orientar os seus jovens a procurarem o Cartório Eleitoral mais próximo até o dia 4 de maio de 2022 para que façam o seu título de eleitor.
A juventude precisa compreender o seu papel, a sua força e o quanto já foi decisiva para a história da democracia brasileira. A sua organização em grêmios estudantis, em centros acadêmicos, em diretórios centrais de estudantes, possibilita ampliar os debates sobre temas tão necessários para o seu desenvolvimento, e um deles é a relevância de sua participação na política local, estadual e nacional.

É fundamental que deixemos de lado “o mundo” criado nas redes sociais e enfrentemos os problemas da vida real à nossa volta – estes, sim, precisam da intervenção e da energia da juventude.

As eleições de 2022 aproximam-se, e precisamos estar atentos aos projetos políticos que estão sendo apresentados para a sociedade. São esses projetos que vão contribuir ou não para a qualidade dos serviços públicos, como saúde, educação, lazer, trabalho, cultura, preservação ambiental, incentivos para a juventude, financiamento estudantil, acesso à universidade e, sobretudo, desenvolvimento humano, dentre tantas outras temáticas fundamentais para a garantia de uma vida com respeito à dignidade humana, assegurada no art. 1º, III da CF/88.
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