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31/01/2020 - 11:03

'Vou morrer e não vou ter visto de tudo...'

 Lembro-me de uma vez em que um juiz de uma cidadezinha do nordeste determinou que os motociclistas não usassem mais capacetes.

Alegava que os pistoleiros se utilizavam do capacete como máscara para ocultar a identidade, ao executarem seus alvos. Por óbvio a sentença não prosperou, visto que o poder judiciário não pode se manifestar contra a lei, ainda mais pelo ‘achismo’ de um juiz.

Bandidos e cidadãos de bem ficaram sem usar capacetes durante um tempo, até que o STF reconhecesse que a função do magistrado não é a de legislar, mas a de garantir a eficácia do direito.

Esta lembrança foi a primeira que me veio à mente quando soube, às 6h da manhã de sábado (28.02), que o Juiz Substituto Permanente R.C.A.C. deferiu a antecipação de tutela ‘no sentido de prorrogar o período de piracema pelo prazo de 30 dias’ (sic).

Desta feita um magistrado, aparentemente orquestrando com o Ministério Público Federal, se contrapôs não somente às leis legitimamente estabelecidas (lei 7.679/88), que determinam o período de defeso, mas também ordenou que o período de reprodução dos peixes se estendesse por mais 30 dias.

Passou agora o judiciário a legislar com as leis da natureza. Isso na maior simplicidade, como se uma gestante de 9 meses, às vésperas do parto, não encontrando ‘condições favoráveis’ pudesse segurar o rebento por mais 30 ou 45 dias, até que o Ministério Público lhe garantisse um leito de hospital.

O mais interessante é que toda a fundamentação da decisão foi feita sobre o empirismo do Ministério Público Federal, que observou não ter o Rio Paraguai subido o nível de água como nos anos anteriores, logo, impedindo o completo ciclo da piracema.

Que pérola! Além de quererem ser chamados de doutores sem cursar doutorado, também querem os nobres representantes ministeriais galgar o título de biólogos!

E repiso, tudo aparentemente orquestrado com o órgão julgador, pois não é aceitável que uma decisão dessa envergadura saísse na calada da noite de antevéspera sem ter um consenso prévio quanto à sua viabilidade. Interessante ainda, e daí o porquê de me utilizar das iniciais do juiz, e não do seu nome, que no senso comum tudo isso não passou de uma ação para evidenciar os nomes de juízes e procuradores da República. Vejam que a intimação com cópia da decisão foi determinada aos órgãos Ibama, Sema e Polícia Ambiental, ainda que por conta da diretora da subseção judiciária de Cáceres fosse também intimada a Marinha do Brasil, mas ninguém se lembrou de intimar o Ministério do Trabalho e Emprego e a Caixa Econômica Federal, para que continuassem a pagar o seguro-desemprego dos pescadores profissionais, já que durante mais um mês ficariam sem poder pescar comercialmente.

Ninguém buscou junto à Unemat, Sematur ou ao próprio Ibama informações técnicas para avaliar o real impacto do nível de águas sobre a desova dos peixes. Ninguém se deu ao trabalho de, quinze dias atrás, buscar informações meteorológicas para ver que não iria chover abundantemente, o que poderia ser feito simplesmente acessando um site na internet, e assim, ingressar com a ação civil pública antecipadamente, dando chance aos milhares de turistas que vieram para as cidades que margeiam o rio Paraguai de desfazerem de seus pacotes e irem pescar na Argentina.

Não, esta seria a pior coisa a fazer, se você quer aparecer. O efeito de suspender a piracema só tem graça se for à véspera de abertura, para pegar todo mundo literalmente com a vara na mão. É certo para quase todos nós de que esta decisão, assim como a de não usar capacetes, não irá prosperar.

Voltando às iniciais do Juiz, proponho que de agora em diante todos os meios de comunicação não divulguem mais os nomes de juízes e promotores.

Divulguem os números dos processos, neste caso especificamente, o 2009.36.01.000787-9, para que de alguma maneira não seja utilizado o poder judiciário como forma de promoção pessoal. Para que as decisões ‘umbigocêntricas’ de alguns juízes fiquem sem sentido, e em outros casos, os nomes de família deixem de ser maculados por besteiras.

Só iniciais, num acróstico da impessoalidade, para todos os juízes. Quanto a mim, me vejo obrigado a expor nome, classificação e apelido, primeiramente porque é vedado por lei o anonimato e não sou parte do processo, e também por não ter medo de expor o que é a expressão não só minha como a de todos aqueles que dependem do turismo ecológico para seu lazer ou sustento na região de Cáceres.”
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