Artigos / José Humberto Pinto

02/03/2017 - 08:42

Carta aberta às pessoas de uma gestão

" A injustiça que se faz a um, é uma ameaça que se faz a todos."  (Montesquieu)
  
O mundo contemporâneo é um mundo conturbado pelos anti-valores. Por  mais que queiramos, nem sempre conseguimos separar o que nos impele a fazer, daquilo que realmente seria o justo fazer. Como nos ensina o apóstolo Paulo, querer o bem está ao nosso alcance, não porém, realizá-lo. Penso que essa é a premissa fundamental sobre a qual devemos as contradições da educação hoje. Queremos o melhor para nossas crianças e a juventude, entretanto nos perdemos em meio a vaidades e as teias da corrupção que se entranha entre os relacionamentos.

Após 8 anos de convivência servindo o CEFAPRO de Cáceres, fui surpreendido pela posição  da  SEDUC  de "renovar" o seu quadro de professores Formadores, em nome do Estado de Transformação e restauração das "políticas públicas" de educação. Ao contemplar a publicação do quadro dessa renovação pude compreender o caráter e a visão - ou da falta destes -, que se descortina nos corações e mentes dos atuais gestores.

Do conjunto das disciplinas oferecidas pela SEDUC, apenas 5 delas (Língua portuguesa, História, Geografia, Matemática, Biologia) e Pedagogia, serão  atendidas em todos os municípios servidos pelos 15 Polos nas diversas Regiões do Estado . As demais, (Inglês, Educação Física, Artes, Filosofia, Sociologia, Física e Química), parecem não interessar às escolas ou não ser objeto de aprendizagem em seus currículos, pelo menos em uma ou outra região, uma vez que não serão preenchidas as vagas em todas as áreas do conhecimento.

Ficam então algumas questões: como pensa a SEDUC em atender a demanda formativa e acompanhar professores de uma determinada escola ou município, quando for solicitada a presença de um(a) Professor(a) Formador(a) especializado (a) numa certa disciplina (Educação Física ou Inglês, por exemplo) se esse(a) professor(a) “não existe” na equipe do CEFAPRO de um determinado Polo? O Estado irá “mapear” regiões para oferecer esta ou aquela disciplina para uma, em detrimento de outras? Parafraseando Orwell, todas as regiões são iguais, mas... haveria uma região mais igual que a outra?

Como explicar essa contradição diante de uma hipótese (por ex.):  Alta Floresta e Confresa necessitam de professores de Química; mas Barra do Garças, Cáceres, Diamantino, Pontes e Lacerda e outras podem ficar sem esse(a) profissional da área? Ora, é possível que uma região, município ou escola seja tão "privilegiada", tão 'plena" de conhecimentos que não tenha a necessidade de Formadores em Artes, Filosofia, Sociologia e outras disciplinas? Afinal, o Estado não é regido por um só Plano de Educação e pelos Parâmetros Curriculares Nacional? Como aplicá-los em sua totalidade sem professores de todas as áreas?

Alguma coisa ficou a desejar nesse novo episódio conturbado pelos lados da SEDUC/CEFAPRO e penso que o critério não foi exatamente de "renovação" em nome de novas diretrizes, mas deixa a entender que houve um claro direcionamento em renovar ou "ceifar" nomes e pessoas dos quadros dos CEFAPROS, por conta do "humor" do juízo e da "concepção" educacional de sua gestão e esse, parece-me ser o caso específico de alguns  "arranjos" no cenário pelos lados do CEFAPRO de Cáceres.

Entristece-me ver o olhar distorcido de gestores, feitores e "lideres sofistas" que, em nome de uma eventual eficiência pública, desmerecem o trabalho, a história pessoal, a dignidade de colegas, ou de ex-colegas no caso, agindo ardilosamente e; impelido por simpatias, causam a alguns o constrangimento de não terem direitos a concorrer à mesma vaga do seu trabalho anterior -visando inclusive sua melhor remuneração -, submetendo-os a trilhar por dificuldades - evitáveis diga-se - por conta de atos insensíveis e interesses pessoais, sem a mínima percepção de que liderar não é simplesmente ter algum poder, é um dom; e que toda perspectiva de poder está na capacidade de benevolência e serviço ao próximo. Ninguém lidera com obsessão em práticas perversas.

Entristece-me saber que ainda há dirigentes que insistem numa visão tacanha e deformada de categoria e de classe e que agem contra o coletivo a serviço do atrelamento político/ideológico do Estado, promovendo o desemprego entre seus pares, em vez de lutar para que todas as disciplinas fossem contempladas e mais Formadores conseguissem ser contratados; como se o custeio do salário alheio viesse do seu bolso e de sua contabilidade.
 
Entristece-me ver Formadores de professores com a reticente visão do caráter práxico da educação por meio dos valores da autonomia e liberdade ensinados pelos fundamentos da Filosofia, Sociologia, História; pesa-me quando vejo que o exercício e o ensino destas disciplinas são subtraídos de forma canhestra, confundindo seus métodos e radicalidade com a pessoa de um Formador.

Entristece-me ver pessoas, mães e pais de família a lutar contra dificuldades nesses "novos e sombrios tempos",  terem suas funções descartadas e salários decrescidos pela simplista visão de chefes gendarmes que posam de luminares e humanistas, quando dissimuladamente tramam contra todas as possibilidades de realização plena do outro. Tartufos travestidos de imaculados.

Entristece-me enfim, a tentativa de ser tratado como mercadoria por agentes de um Estado corrupto e despótico que conta com a complacência de grande maioria de seus servidores serviçais, que ainda não entenderam que um Estado de Direito se faz no conjunto da crença na igualdade da dignidade humana e na luta por condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o  desemprego.

Invariavelmente, a corrupção de uma pessoa começa sempre com a corrupção de seus princípios. Tristes tempos, tristes fins.
José Humberto Pinto

por José Humberto Pinto

é professor em Cáceres-MT
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3 comentários

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  • por Reinaldo Marchesi, em 03.03.2017 às 02:10

    Dileto professor Humberto, acertou no alvo! A educação está cheia de capitães do mato. Infelizmente nem todos têm consciência de classe. O egoísmo, os interesses pessoais, as vantagens e os pequenos privilégios de alguns gestores determinam sobre os da coletividade. O que mais me indigna é a capacidade bovina que muitos têm em se adaptar passivente diante de tantas injustiças e problemas. O Sintep é o maior sincato do estado, eu me pergunto: Onde está? O que faz? Como faz? Quando faz? A quem faz? Se tivessemos um sindicato forte (e não apenas numérico), muita coisa mudaria. Assim, caso tais gestores ousassem arbitrar dessa forma sobre nossas vidas, pensariam duas vezes. Continue a denunciar através de seus textos, são bastante esclarecedores. Forte abraço meu caro, a luta continua!

  • por Regis Oliveira, em 02.03.2017 às 18:12

    Quando o privado sobrepõe o público têm-se a certeza os princípios que deveriam nortear os gestores público não valem mais que um centavo furado.... Pena que essa realidade esteja tão próximo de nossa fuça....

  • por Roberto Ferreira de Oliveira, em 02.03.2017 às 14:54

    É isso ai Humbertinho. Quem não luta pelo seus direitos não é digno tê-los. Somente os fracos e acovardados falam pelos cantos. A verdade precisa ser dita. Se calarmos a tendência é ficar prior. É uma vergonha o que estão fazendo com a educação.

 
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