Artigos / José Renato de Oliveira Silva

12/05/2016 - 13:17

O governo interino promete recolocar as mulheres e os negros em seus devidos lugares

O governo (provisório?) de Michel Temer será o primeiro, depois de três décadas, sem uma única mulher a integrar seu ministério. Pelo menos é assim que inicia, ainda que depois se dê conta que pegou mal e busque alguma figura, talvez decorativa, pra enfeitar a esplanada. Até o general Figueiredo (1979/1985), aquele que dizia preferir os cavalos ao ser humano, tinha uma mulher ministra, na educação.

Como relatado pela Folha de São Paulo, Sarney (1985/1990) teve uma ministra, Collor (1990/1992), Itamar (1992/1995) e FHC (1995/2003) duas cada, Lula (2003/2011) teve onze ministras e Dilma quinze. Daí voltamos a zero em maio de 2016.

De acordo com dados da última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio, divulgada em 2013 pelo IBGE, as mulheres são a maioria da população, 51,4%, e respondem por 37,3% das famílias brasileiras. É uma crescente.

A composição do ministério Temer representa a devolução das mulheres ao lugar de onde, sinaliza o novo (?) governo, nunca deveriam ter saído: o lar. E que sejam belas e recatadas. E se não forem do lar nem recatadas, que ao menos sejam belas, para que se prestem a cantadas e estupros, quem sabe até por excelências como Jair Bolsonaro.

Pelo menos o deputado, que tem no torturador Ustra seu ideal de civilidade, não será ministro da Justiça e Cidadania. Antes dele tomou assento Alexandre de Moraes, secretário de segurança pública de São Paulo, da cota de Eduardo Cunha, de quem foi advogado. Um constitucionalista que ontem insinuou que os protestos contra o novo (?) governo deverão ser reprimidos como atos de guerrilha.

O mesmo jornal Folha de São Paulo traz uma primeira impressão de Manoela Miklos, doutora em relações internacionais e criadora do blog #AgoraÉQueSãoElas, sobre esse retrocesso abissal na representação das mulheres: “Tem uma dimensão simbólica, mas também diz muito do que podem ser as políticas públicas capitaneadas por um grupo tão pouco diverso.”

A propósito, o governo Temer também inicia sem um único negro no ministério. E os negros são 54% da população do país, segundo dados do IBGE divulgados em 2015. Sintomático, não?

Se a maioria de negros e mulheres será assim “priorizada” no novo ministério, que será das minorias?

A Secretaria de Direitos Humanos (criada por FHC em 1997) desaparece e seus assuntos serão administrados por Alexandre de Moraes, já célebre pela criminalização de movimentos sociais.

A Previdência será incorporada à Fazenda e gerida pelo banqueiro Meirelles, o que deixa o mercado eufórico.

A Cultura é reincorporada à Educação e será gerida pelo deputado Mendonça Filho, do DEM (antiga UDN). Quanta transformação!

O governo interino nasce ilegítimo, e assim será enquanto perdurar, pois viola princípio constitucional inerente e indispensável à democracia, o da soberania popular. Uma ilegitimidade respaldada pelo STF e apoiada pela OAB.

Em 2 de abril de 1964, o Presidente do STF comunicou que a tomada do poder pelos militares, com a consequente deposição do presidente João Goulart, que fora eleito pelo povo, estava em conformidade com a constituição, e afirmou que se fazia necessária em momentos de crise a “relativização das garantias e dos princípios democráticos”. A OAB apoiou aquele golpe, arrependeu-se depois.

Como em 1964, revivemos o caos. As instituições estão falidas.

Essa é a ponte para o futuro que nos oferece o mordomo do Jaburu. O passado mudou de nome. É de doer, é de temer.
José Renato de Oliveira Silva

por José Renato de Oliveira Silva

é advogado e professor
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  • por ROBSON JOSÉ, em 13.05.2016 às 11:04

    Perfeito o artigo. O último parágrafo diz tudo que qualquer pessoa de bom senso e com o mínimo de conhecimento diria, infelizmente estamos sendo levados por uma grande parte da mídia e estamos esquecendo de uma coisa que lutamos muito para conquistar nesse país, a democracia.

 
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