Artigos / Luciana Pelaes Mascaro

27/09/2015 - 07:54

Por que todo o centro foi tombado ?

Dando continuidade aos temas relativos ao tombamento do patrimônio arquitetônico e paisagístico e que provocam dúvidas, vamos ao seguinte ponto: afinal, por que todo o centro foi tombado e não apenas alguns prédios mais importantes?

Resposta: por vários motivos, dos quais destacamos dois.
Motivo 1: a história.

O patrimônio arquitetônico e paisagístico conta a história da cidade e da região. Vamos supor que, num futuro distante, tenham restado apenas um hospital e um palácio de uma cidade qualquer. E mais nada; nem mesmo as fundações de outros prédios. Nenhum outro vestígio.

Olhando para o hospital e para o palácio, um historiador poderia supor que as pessoas que enchiam o hospital vinham de longe, pois não encontrou ali mais nenhuma habitação... Seria verdade? Quem pode saber se não existem outros elementos para analisar? afinal, por que construir um hospital apenas para algumas poucas pessoas que viviam no palácio?

Percebemos então que, quantos mais elementos temos para compreender a história, mais próximos da realidade conseguimos chegar. Nunca temos todos os elementos. Assim, contar a história de uma cidade a partir somente de seus prédios mais ricos e importantes é contar uma história parcial.

Portanto, é irresponsável desprezar toda uma parcela de testemunhos apenas por serem modestos.

Devemos transmitir para as gerações futuras todas as informações possíveis sobre o passado e o presente.


Por isso, tomba-se o conjunto completo do centro antigo das cidades com todos os seus edifícios: os ricos e os pobres. O conjunto conta uma história muito mais completa e é muito mais eficaz para manter e transmitir essa história.

Motivo 2: as características físicas

Cada cidade é única e isso depende de vários fatores: as características do seu relevo, o desenho das suas ruas, a disposição e a altura dos seus edifícios etc. Além disso, cada cidade é, como já dissemos, um artefato constituído por seus prédios e seus espaços vazios. Ela é um conjunto, um todo.

A cada vez que um dos elementos que constituem a cidade é modificado, o conjunto é modificado. Neste sentido, uma característica que causa grande impacto no conjunto é a alteração das alturas dos prédios.

Por exemplo, imagine um centro antigo. No caso das cidades brasileiras, por causa da herança portuguesa e das condições locais, em geral, o prédio que se destaca nos centros é o prédio da igreja: ele é mais alto e está numa posição estratégica em relação aos prédios próximos.

Imagine agora um prédio com a mesma altura da igreja construído ao seu lado. Atrás da igreja, outros três prédios, mais altos que ela. E, assim, sucessivamente, prédios altos em toda a proximidade da igreja.

A igreja continua em perfeito estado de conservação, mas não podemos mais vê-la à distância. O destaque que ela tinha na paisagem desapareceu... O conjunto foi completamente alterado. As suas características espaciais originais se perderam.

Percebemos, assim, que a relação das alturas existente entre os prédios principais e os outros é extremamente importante para a manutenção de certos valores da cidade.

Então, para evitar esse tipo de degradação, para que possamos continuar a perceber o espaço urbano como originalmente concebido e construído, tomba-se o conjunto dos prédios do centro -, incluindo os modestos que, aparentemente, não teriam interesse.

Ou seja, os prédios mais modestos, que constituem o conjunto do centro antigo, são preservados para promover a adequada preservação daqueles prédios mais suntuosos e para manter os valores e características originais do espaço urbano.

Pelos mesmos motivos, as alturas dos prédios que serão construídos em centros tombados são limitadas por lei.

Por causa da vocação da região histórica da cidade, prédios cujas alturas ferem a altura do conjunto original devem ser construídos em outras regiões da cidade, segundo determinações do planejamento urbano.
Luciana Pelaes Mascaro

por Luciana Pelaes Mascaro

Coordenadora do Depto. de Arquitetura e Urbanismo Faculdade de Arquitetura, Engenharia e Tecnologia
Universidade Federal de Mato Grosso - Cuiabá
+ artigos

Comentários

inserir comentário
2 comentários

AVISO: Os comentários são de responsabilidade de seus autores e não representam a opinião do Jornal Oeste. É vetada a inserção de comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros. O site Jornal Oeste poderá retirar, sem prévia notificação, comentários postados que não respeitem os critérios impostos neste aviso ou que estejam fora do tema da matéria comentada.

  • por WALDEMAR G DE OLIVEIRA, em 12.04.2016 às 11:42

    Não consigo entender tal logica, a unica coisa que sei bem é que na qualidade de proprietário, não mais podemos decidir sobre o que queremos fazer na propriedade(modiificar,reformar e etc) aí eu pergunto, e o meu direito de propriedade como fica.

  • por Alfredo antunes, em 27.09.2015 às 23:24

    Falta do que fazer esse povo Porque não vão tombar a casa deles? Esses teóricos acham que podem chegar aqui e se apropriar das coisas dos outros. Chega dessa palhaçada de tombamento. Fora iphan.

 
Sitevip Internet