Artigos / Bruno de Jesus Barros

21/03/2025 - 14:40 | Atualizado em 21/03/2025 - 14:43

O PAPEL ESSENCIAL DO CONSELHO DA COMUNIDADE

O PAPEL ESSENCIAL DO CONSELHO DA COMUNIDADE NO DESENVOLVIMENTO DA SOCIEDADE CACERENSE

A Lei de Execução Penal (LEP) - Lei n. 7.210, que regulamenta o cumprimento das penas no Brasil, foi publicada em 11 de julho de 1984. O objetivo primordial da referida lei é a reintegração social da pessoa privada de liberdade, ou seja, sua devida readequação ao convívio em sociedade.

Contudo, em terras tupiniquins, promover a ressocialização e evitar/diminuir a reincidência não é uma tarefa fácil. O Brasil é um dos países nos quais mais se encarcera no planeta, ocupando a terceira posição de maior população carcerária do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos e China, respectivamente.

Malgrado tenhamos aumentado consideravelmente a população carcerária nos últimos 20 anos, o Estado não teve condições ou não se preocupou em criar e ampliar significativamente os estabelecimentos prisionais existentes. Tal cenário, aliás, fez com que o Supremo Tribunal Federal, no ano de 2023, reconhecesse a violação massiva de direitos no sistema carcerário brasileiro, entendendo pelo “estado de coisas inconstitucional” do sistema carcerário.

Inúmeros estudos indicam que é praticamente impossível promover a ressocialização sem garantir a dignidade da pessoa privada de liberdade. Além disso, muito bem sabemos que uma ressocialização adequada minimiza a reincidência, gera segurança, bem-estar e desenvolvimento social. Portanto, ressocializar é uma tarefa substancial em todos os níveis e instâncias da sociedade.

Ao Estado, portanto, cabe a tarefa de promover a assistência ao preso a fim de “proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado” (art. 1º, LEP). A assistência devida pelo Estado é ampla e está prevista no art. 10 e 11, da LEP, quais sejam, assistência material, saúde, jurídica, educacional, social e religiosa. Cabe ressaltar que a assistência devida pelo Estado não se limita a tal rol e é muito mais ampla.

Inobstante, a tarefa de ressocializar não é única e exclusiva do Estado, cabe também à sociedade o dever de promover, harmonicamente, a aludida reintegração social. A propósito, o art. 4º, da LEP, diz que “Estado deverá recorrer à cooperação da comunidade nas atividades de execução da pena e da medida de segurança”, em outras palavras, a “Lei de Execuções Penais foi publicada sob a concepção de que a execução penal não deve ser totalmente afastada da sociedade civil, mas deve, sim, contar com a participação da sociedade”.

Diante desse dever, a Lei de Execução Penal criou os Conselhos da Comunidade, órgão da execução penal, com previsão nos arts. 80 e 81 da LEP, “cuja função é realizar a articulação e o diálogo entre a sociedade civil os demais órgãos de execução penal”. Ou seja, o conselho é um porta-voz da sociedade junto ao cumprimento da pena, cujo objetivo central é aprimorar o sistema prisional.

Nessa perspectiva, aos conselhos cabe visitar os estabelecimentos prisionais, entrevistar presos, apresentar relatórios ao juiz da execução e, substancialmente, diligenciar a obtenção de recursos materiais e humanos para melhor assistência ao preso, em harmonia com a direção do estabelecimento (art. 81, da LEP). Cabe destacar que esse rol de ações é exemplificativo – não taxativo –, ou seja, não se exclui a possibilidade de os Conselhos da Comunidade realizarem ações não explicitamente previstas na LEP, desde que tais ações sejam coerentes com as finalidades e os princípios dos Conselhos.

Em Cáceres/MT, a atuação do Conselho da Comunidade é diversa, ampla e ativa. São realizadas reuniões mensais nas quais a sociedade e instituições parceiras (públicas e privadas) podem trazer ideias e propor projetos e demandas. Além disso, o Conselho faz a gestão, em harmonia com a direção do estabelecimento prisional, dos trabalhos extramuros em diversas empresas e instituições.

A exemplo, a prefeitura de Cáceres e Águas do Pantanal empregam inúmeros reeducandos para diversas atividades. O trabalho extramuro, além de ser uma fonte de renda para a família vulnerável da pessoa privada de liberdade, é uma ótima ferramenta de ressocialização. Basta olharmos o número de reincidência dos presos que laboraram no sistema extramuro e veremos que é baixíssima.

Ainda, o Conselho, atualmente, faz a gestão de distribuição de produtos permitidos dentro das unidades prisionais femininas e masculina de Cáceres, conforme permite o art. 13, da LEP, o qual diz que “O estabelecimento disporá de instalações e serviços que atendam aos presos nas suas necessidades pessoais, além de locais destinados à venda de produtos e objetos permitidos e não fornecidos pela Administração.”
A fonte de renda gerada pelo centro de distribuição de mercadorias, administrado pelo conselho sob a supervisão da direção da cadeia, é totalmente reinvestida e devolvida para as unidades prisionais, além de garantir o funcionamento e logística do Conselho. Para termos noção, somente no ano de 2024, mesmo diante das dificuldades financeiras enfrentadas, o Conselho investiu mais de R$ 314.000,00 (trezentos e quatorze mil reais), nas cadeias de Cáceres/MT, com recurso advindo do mercado e do Poder Judiciário.

A assistência prestada pelo conselho vai desde pequenas melhorias na unidade como uma troca de lâmpada, até a realização de obras e reformas mais amplas, a exemplo da reforma realizada na parte elétrica da cadeia feminina, diante do pedido de interdição realizado no ano passado pelo Ministério Público. O Conselho de Cáceres também exerce um papel importantíssimo na assistência da saúde dos presos, como a compra de medicamentos e fornecimento de insumos e produtos para o funcionamento do Consultório Odontológico instalado na unidade prisional masculina, o qual foi estabelecido pelo Conselho no ano de 2024.

Enfim, o Conselho da Comunidade desempenha um papel fundamental na recuperação das pessoas privadas de liberdade e precisa, mais do que nunca, ser fortalecido. A participação da sociedade é essencial para o aperfeiçoamento da execução penal e o desenvolvimento da comunidade cacerense.

Àqueles que desejam contribuir com essa causa podem participar das reuniões do Conselho. Para mais informações, dúvidas ou acesso ao calendário de encontros, estamos à disposição pelo contato funcional (65 99903-7954). As reuniões acontecem no novo prédio do Conselho, anexo ao Escritório Social, localizado na rua Padre Casemiro, em frente à feira.

Juntos, podemos transformar vidas e construir uma sociedade mais justa e inclusiva!
Bruno de Jesus Barros

por Bruno de Jesus Barros

Bruno de Jesus Barros. Advogado (OAB/MT nº 28.047). Presidente do Conselho da Comunidade de Cáceres/MT. Vice-Presidente da Federação dos Conselhos da Comunidade de Mato Grosso (FECCOMAT). Presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB Cáceres/MT. Pós-Graduando em Processo Penal.
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  • por Renata Farias , em 21.03.2025 às 16:58

    Excelente matéria! A explicação sobre a função do Conselho da Comunidade está clara e bem detalhada, trazendo informações importantes de forma acessível e esclarecedora.

 
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