Artigos / Pablo Pizzatto

13/03/2021 - 07:44

Adicional de Penosidade: Demora Infinita do Executivo Estadual

A LEI COMPLEMENTAR Nº 04, DE 15 DE OUTUBRO DE 1990, que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos do Estado de Mato Grosso, das autarquias e das fundações públicas estaduais, em seu art. 82, inc. II, prevê a possibilidade de deferimento do adicional pelo exercício de atividades insalubres, perigosas ou penosas; nos arts. 88 e 89, fez previsão dos adicionais de atividades penosas, de insalubridade e de periculosidade; e, no art. 90, tratou especificamente do adicional de atividade penosa, considerando-o devido aos servidores com exercício em zonas de fronteira ou em locais cujas condições de vida o justifiquem, nos termos, condições e limites fixados em regulamento.
 
Ainda nos arts. 88 e 89 existe previsão determinando que cabe à Administração do Estado, além do permanente controle da atividade dos servidores em locais considerados penosos, a instituição regulamentar do referido adicional, que nunca foi feita, mais de 30 (trinta) anos depois. Sim, são mais de 30 (trinta) anos à espera do Executivo.
 
Neste tempo todo, i. e., em mais de 30 (trinta) anos, nunca/jamais houve qualquer iniciativa do Estado de Mato Grosso em adotar as providências pertinentes para pagar o referido adicional, mesmo com as determinações legais no sentido de que cabe “(...) à Administração Estadual exercer permanente controle da atividade de servidores em operações ou locais considerados penosos, insalubres ou perigosos.”
 
De uma simples leitura do art. 90 (“será devido ao servidor em exercício em zonas de fronteira”), não há qualquer dúvida no sentido de que a LEI COMPLEMENTAR Nº 04, DE 15 DE OUTUBRO DE 1990 claramente institui o Adicional de Penosidade aos servidores do Estado de Mato Grosso, determinando a adoção das providências cabíveis ao pagamento pelo ente estatal, que nunca realizou o que lhe cabe fazer.
 
Referido direito, ao qual, por mais de 30 (trinta) anos, mantém-se indiferente o Estado de Mato Grosso, descende diretamente da Constituição Federal/1988 (art. 7º, XXII e XXIII, da CF), de forma que o Executivo não ignora só a Lei Complementar do Estado, mas um mandamento constitucional.
 
É de se anotar, também, que o Adicional de Penosidade/Fronteira já vem sendo, de há muito, pago aos militares das Forças Armadas e aos servidores da União, sendo inolvidável a patente inércia do Estado de Mato Grosso, mesmo frente ao arcabouço normativo que se apresenta nas esferas Estadual e Federal.
 
Na esfera do Poder Executivo federal, inclusive, ainda no ano de 2013, foi sancionada a Lei n. 12.855/2013, que institui indenização aos servidores públicos regidos pela Lei n. 8.112/1990, que estejam em exercício de atividade em delegacias, postos e unidades situadas em localidades estratégicas, vinculadas à prevenção, controle, fiscalização e repressão de delitos transfronteiriços, contemplando especificamente as carreiras e os planos especiais de cargos de Policial Federal, Policial Rodoviário Federal, da Receita Federal, Fiscal Federal Agropecuário e Auditoria Fiscal do Trabalho.
 
Ressoa ilógico que os servidores estaduais que atuem em funções idênticas ou assemelhadas, e, sabidamente, com estrutura e remuneração bem mais deficiente, ainda não recebam o valor, sob a paradoxal e não menos vergonhosa alegação do Estado de que o Executivo ainda não regulamentou o adicional.
 
Dado o longo lapso temporal desde que o pagamento de tal verba foi previsto (LEI COMPLEMENTAR Nº 04, DE 15 DE OUTUBRO DE 1990 (arts. 88, 89 e 90) no Estado de Mato Grosso, não se pode admitir que o benefício ainda dependa da boa vontade do Executivo, a falar-se em “regulamentação específica” para sua atrasada incidência, sob pena de sacrificar indefinidamente o servidor público, negando vigência à Lei Complementar por omissão administrativa, quando caberia ao Estado a revisão periódica das condições de trabalho, inclusive as ambientais, no que se enquadra a concessão de verba indenizatória pelo exercício de atividade em localidade especial, como a região de fronteira.
 
Policiais Militares, Civis e Servidores de Órgãos de Fiscalização, com os pertencentes aos quadros do INDEA, são os principais prejudicadas pela definitiva inércia do Estado, que tem se utilizado, muitas vezes com a chancela do Judiciário, da própria omissão para beneficiar-se nas ações de corajosos servidores na Justiça, que têm pleiteado o referido adicional.
 
Há mais de 30 (trinta) anos os servidores públicos do Estado de Mato Grosso, notadamente os pertencentes aos quadros da Polícia Militar, Civil e do INDEA, amargam toda essa inércia à espera da dita regulamentação específica (decreto, instrução normativa, etc.), por meio da qual, em tese, se defina a “dita” inteireza do conteúdo normativo a, pretensamente, viabilizar o exercício daquele direito insculpido nos arts. 88, 89 e 90 da LEI COMPLEMENTAR Nº 04, DE 15 DE OUTUBRO DE 1990.
 
Como categoria de trabalhador, o servidor público, notadamente o Policial Militar e Civil, tem direitos sociais fundamentais assegurados constitucionalmente, entre eles, o trabalho seguro e hígido, garantido pela Constituição da República em seus arts. 7º, inc. XXII e 39, § 3º, do que resulta que não pode ser óbice à concessão ou ao reconhecimento do Adicional de Penosidade/Fronteira a inexistência de regulamento, após mais de 30 (trinta) anos de vigência da Lei Complementar Estadual – e da própria CRFB/88 – que o assegura, sem que tenha ainda sobrevindo aquela dita “legislação” a pretensamente tornar viável o exercício de tal direito.
 
Outrossim, às expensas da (ir)responsabilidade do Executivo Estadual, cabe ao Judiciário cumprir com sua cota de responsabilidade de integração do ordenamento jurídico, assegurando, diante de tamanha e definitiva omissão, o direito constitucionalmente assegurado aos servidores do Estado.
 
Ora, quer-se dizer que não basta simplesmente reconhecer a ausência de regulamento, é preciso, mais de 30 (trinta) anos depois, suprir e integrar, segundo diretivas constitucionais, a carência que se arrasta por mais de três décadas em Mato Grosso, e que compromete e prejudica, pelo menos, três gerações de servidores, mormente Policiais Militares, a quem sequer é dado o direito à greve, à sindicalização ou filiação partidária, típicos meios de instrumentalização de pressão política (art. 142, incs. IV e V, c.c. art. 42, §1º, ambos da CRFB/88).
 
É, à guisa de conclusão, necessário que a Justiça cumpra seu papel constitucional frente ao absurdo instalado, e, mais do que reconhecer 30 (trinta) anos de omissão, exija do Estado de Mato, pelo menos, uma atuação proativa, que garanta mais respeito ao servidor público, mormente às Polícias e Agentes de Fiscalização, hoje, certamente, as principais categorias responsáveis pela segurança dos mato-grossenses nas áreas de fronteira.
 
Pablo Pizzatto

por Pablo Pizzatto

Advogado com atuação em direito público Sócio do Escritório Curvo e Pizzatto Advogados em Cáceres/MT
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